Vi pela primeira vez pirolitos á venda e bebi um, durante a festa do S, João no Sobreiro por volta de 1957. Naquele tempo a festa de S. João (Baptista) também chamado pelas pessoas do Sobreiro S. João do Toledo – claro que não era um S. João oriundo da cidade de Toledo, Castela-a-Velha, em Espanha – mas do toledo (tolices), porque as pessoas do Sobreiro pregavam partidas umas às outras e dançavam no arraial, que naquele tempo só acontecia na festa de S. João onde não havia missa ou procissão ou padres, como se estivessem tolos. O S. João Baptista era naquele tempo um santo popular e o dia 24 de Junho, como é sabido, é muito perto do solstício de verão, a 21 de Junho.
Lembro-me que havia homens e mulheres a vender tremoços, amendoins, chupa-chupas, vinho, alguns petiscos e pirolitos no Largo do S. João. Os garotos divertiam-se a apanhar canas de foguetes depois de explodirem no ar, passeavam pela festa, pensavam nas miúdas, mas éramos demasiadamente novos para dançar ao som dos “jazes” como os Perus ou os Pavões.
Se tivéssemos dinheiro comprávamos um pirolito. Havia poucos frigoríficos naquele tempo, não havia arcas congeladoras, nem gelo e os pirolitos estavam quentes, mas eram deliciosos. O berlinde que impedia a saída da bebida tinha de ser empurrado para dentro da garrafa com o dedo para se poder beber o pirolito – termo também dado a um gole de água quando nadávamos nos poços, nas presas (represas) ou na praia. Eu não tinha força para empurrar o berlinde com o dedo, por isso pedia ao taberneiro para o fazer. Este empurrava-o com um pau para dentro do pequeno espaço do gargalo da garrafa que retinha o berlinde.
Não sei a composição do pirolito mas assemelhava-se a uma gasosa e continha água, açúcar, talvez um toque de limão e dióxido de carbono (CO2). O CO2 tinha três funções: tornar a mistura efervescente para ser mais agradável, retardar o crescimento microbiano na bebida e pressionar o berlinde contra a vedante de borracha no interior do gargalo da garrafa. Disseram-me em tempos a garrafa, com a bebida carbonatada era invertida, agitada para produzir dióxido de carbono que aumentava a pressão dentro da garrafa e mantinha o berlinde empurrado contra o vedante. Claro que os pirolitos pecavam por falta de higiene e a parte superior do gargalo ficava exposto ao exterior e com restos de açúcar que servia para a proliferação de micróbios. Nunca conheci alguém que ficasse doente por beber um pirolito, mas as garrafas foram proibidas há muito tempo.
Quando se partia uma garrafa podia-se aproveitar a pesada esfera de vidro para jogar “ao berlinde”. Confesso que, em Portugal, nunca joguei com este material, pelo simples facto de não possuir berlindes. Jogava, com os outros miúdos do Sobreiro, “à bugalha” que procurávamos nos carvalhos e que são bem redondinhas.
Não podemos confundir bugalhas com bolota. As bolotas são os frutos de carvalhos, enquanto que as bugalhas devem-se a uma reacção induzida por um ovo depositado logo debaixo da casca do carvalho por vespas da família Cynipidae. O ovo germina dentro da bugalha onde se transforma numa vespa. Claro que a vespa usa a bugalha para proteger os seus descendentes.
Cortem uma bugalha a meio e encontrarão um ovo, uma larva, uma pupa ou uma vespazinha com asas. Se a vespa tiver já saído deste invólucro protector, encontrarão um orifício no exterior e um espaço ovóide no centro do bugalha.
Cortem uma bugalha a meio e encontrarão um ovo, uma larva, uma pupa ou uma vespazinha com asas. Se a vespa tiver já saído deste invólucro protector, encontrarão um orifício no exterior e um espaço ovóide no centro do bugalha.
Hoje, garrafas de pirolito são coleccionadas por aqueles que se lembram desses tempos. Eu comprei duas a um antiquário há muitos anos e uma ainda tem o vedante de borracha. O Sérgio, ao que parece, também tem uma.
Milton Costa
Obs. de altino - imagem adaptada de VESPAS http://en.wikipedia.org/wiki/Gall_wasp
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