Está há muito determinado, pelo que mais do que verdade incontestada tal afirmação se tornou num verdadeiro dogma; “Portugal é um país de brandos costumes”.
Não é esta a ocasião para questionar o que é ponto assente. Aceitemos então que Portugal é um país de brandos costumes, o que até pode ser verdade a avaliar, por exemplo, pela brandura com que os derrotados das revoluções de 1910 e 1974 foram tratados. Mas Portugal é também um país de exacerbadas paixões, de “verdades” que subitamente se universalizam, de crenças, valores ou conceitos que, como por um passo de magia, se tornam esmagadoramente maioritários.
Foi assim na transição da Monarquia para a República, a ponto de D. Carlos ter dito que vivia numa “monarquia sem monárquicos”, como se comprovou no 5 de Outubro de 1910. Foi assim depois de Abril de 1974 quando desapareceram do mapa os defensores do regime deposto, e entre nós já só havia democratas de cravo no peito. Esta tendência para integrar o grupo das ideias dominantes tem sido uma das características lusas, tudo sempre fundado numa intrínseca capacidade/necessidade de engrossar as fileiras da “verdade indiscutível” de cada momento.
Estar em grupo e em maioria é a forma de cada um alicerçar a sua credibilidade. E quando se trata de crer somos capazes de o fazer de forma total e absoluta. Acreditamos em ideais mágicos, em falsos D. Sebastião ou até que o sol é capaz de rodopiar sobre uma oliveira.
A tendência para a “unanimidade das almas” sempre teve uma dimensão de fé, coisa total e absoluta que, apesar dos brandos costumes, nos tem levado a algumas experiências políticas únicas nos anais da história universal. Vem tudo isto a propósito da Greve Geral marcada para amanhã, dia 30, coisa afinal insignificante quando comparada com greves de outros tempos.
A GREVE DO VENTRE
Pouco depois da implantação da República o governo provisório chefiado por Teófilo de Braga legislou concedendo o direito à greve, garantindo «aos operários, bem como aos patrões, o direito de se coligarem para a cessação simultânea do trabalho.»
Empolgados com tal possibilidade todos sentiram a irrecusável necessidade de exercer tal direito, e a greve transformou-se na “solução” para todos os problemas. A onda grevista atravessou as mais diversas classes profissionais: operários, empregados de companhias comerciais e de transportes, ferroviários, telefonistas, pedreiros, empregados da Carris, estivadores, operários corticeiros, padeiros, sapateiros, caixeiros e trabalhadores rurais, etc. Da cidade a contestação estendeu-se ao campo. Todos queriam mudar de vida!
Só no ano de 1911 rebentaram 193 greves e, como sublinhou Fialho de Almeida, “três ou quatro das quais bastariam para pôr em perigo o governo provisório.”
Não é esta a ocasião para questionar o que é ponto assente. Aceitemos então que Portugal é um país de brandos costumes, o que até pode ser verdade a avaliar, por exemplo, pela brandura com que os derrotados das revoluções de 1910 e 1974 foram tratados. Mas Portugal é também um país de exacerbadas paixões, de “verdades” que subitamente se universalizam, de crenças, valores ou conceitos que, como por um passo de magia, se tornam esmagadoramente maioritários.
Foi assim na transição da Monarquia para a República, a ponto de D. Carlos ter dito que vivia numa “monarquia sem monárquicos”, como se comprovou no 5 de Outubro de 1910. Foi assim depois de Abril de 1974 quando desapareceram do mapa os defensores do regime deposto, e entre nós já só havia democratas de cravo no peito. Esta tendência para integrar o grupo das ideias dominantes tem sido uma das características lusas, tudo sempre fundado numa intrínseca capacidade/necessidade de engrossar as fileiras da “verdade indiscutível” de cada momento.
Estar em grupo e em maioria é a forma de cada um alicerçar a sua credibilidade. E quando se trata de crer somos capazes de o fazer de forma total e absoluta. Acreditamos em ideais mágicos, em falsos D. Sebastião ou até que o sol é capaz de rodopiar sobre uma oliveira.
A tendência para a “unanimidade das almas” sempre teve uma dimensão de fé, coisa total e absoluta que, apesar dos brandos costumes, nos tem levado a algumas experiências políticas únicas nos anais da história universal. Vem tudo isto a propósito da Greve Geral marcada para amanhã, dia 30, coisa afinal insignificante quando comparada com greves de outros tempos.
A GREVE DO VENTRE
Pouco depois da implantação da República o governo provisório chefiado por Teófilo de Braga legislou concedendo o direito à greve, garantindo «aos operários, bem como aos patrões, o direito de se coligarem para a cessação simultânea do trabalho.»
Empolgados com tal possibilidade todos sentiram a irrecusável necessidade de exercer tal direito, e a greve transformou-se na “solução” para todos os problemas. A onda grevista atravessou as mais diversas classes profissionais: operários, empregados de companhias comerciais e de transportes, ferroviários, telefonistas, pedreiros, empregados da Carris, estivadores, operários corticeiros, padeiros, sapateiros, caixeiros e trabalhadores rurais, etc. Da cidade a contestação estendeu-se ao campo. Todos queriam mudar de vida!
Só no ano de 1911 rebentaram 193 greves e, como sublinhou Fialho de Almeida, “três ou quatro das quais bastariam para pôr em perigo o governo provisório.”
Empolgados com a ideia de transformarem Portugal pela via grevista os portugueses do início do século XX utilizaram esta arma com requintes nunca antes experimentados. O projecto alcançou o seu auge, ultrapassou tudo o que ideólogos, filósofos e quejantos já tinham conjecturado quando, no meio da euforia grevista, foi lançada a palavra de ordem, a tal, que finalmente iria revolucionar a vida dos portugueses:
“Mulheres não procreeis!”, apelava um folheto de 1912 incitando à greve dos ventres femininos. Tudo afinal por uma boa causa já que “ neste oceano de fomes, de opressões, de martírios e vilanias”, a solução era “ não aumentardes o número de miseráveis; declarardes a Greve de ventres”.
Isto aconteceu na Primeira República e muitos pensaram que seria difícil ir mais longe. A esmagadora maioria julgou que nunca mais se conseguiria inovar, ou mesmo introduzir novas interpretações no conceito de greve. Pois estavam enganados.
Na sequência da revolução de Abril de 1974 de novo fomos capazes de ultrapassar o impensável e de dar ao mundo uma nova e gloriosa lição sobre o direito à greve. Os manuais de ciência política tiveram que ser reescritos pois Portugal veio demonstrar que a greve, enquanto conceito democrático e transformador da sociedade, pode e deve ser exercido por todos, incluindo o governo da nação.
Foi assim que o conselho de ministros, presidido por Pinheiro de Azevedo, decidiu “suspender a actividade”. Portugal teve o primeiro governo do mundo que entrou em greve. A greve do Poder. A audácia da Primeira República estava ultrapassada.
Tem por isso especial importância histórica o vídeo que hoje editamos (mais abaixo). Vale a pena recordar Pinheiro de Azevedo a explicar aos jornalistas a situação (“fora do normal”) do processo político em curso!
O povo de brandos costumes é capaz dos maiores atrevimentos mas, mesmo em greve, nunca perde um almocinho…
Belino Costa
Análise curiosa que me lembra a tendencia para a unanimidade sempre que algum governo quer fazer alguma coisa. O coro do contra manifesta-se hoje contra a Ota como se manifestou ontem contra o Centro Cultural de Belém, contra a POnte Vasco da Gama, contra a Expo, contra os estádios de Futebol. Quem não faz não gosta que os outros façam, é por isso que o PSD está hoje cheio de tecnicos de aeronautica. Os mesmos que quando estavam no Poder defendiam a OTA como solução para o novo aeroporto. Enfim, é o Portugal unanimista do deita abaixo no seu melhor.
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