«A imagem chegou-me aos olhos trazida das funduras do tempo. Uma garrafa de pirolito! De vidro grosso, esverdeado. Que vinha para as lojas em grades de madeira, talvez de umas duas dúzias, e que refrescava as gargantas sequiosas nas tabernas e nos adros, em plena romaria…
Há quantos anos não a via? Obrigado, Sérgio, pela imagem recolhida sabe-se lá onde. Estou a vê-la e a recordar. A garrafa tinha uma argola de borracha vermelha no topo, onde encaixava a bolinha também de vidro. Quantas garrafas nós partimos à socapa para arranjar aqueles tão cobiçados «berlindes»?!
Abríamos o pirolito enfiando o dedo indicador e empurrando a bolinha para dentro. (Serviria de treino aos garotos para encenar estupros?) Por vezes, com o calor – porque o luxo dos frigoríficos ainda não chegara à terrinha, a água dos poços nem sempre estava à mão -, o líquido borbulhante espumava para fora, champanhe popular a derramar-se.
Era barato. E servia para misturar com vinho (aguando-o). Bom negócio da fábrica: água, uma pitada de açúcar e de gás… e estava feito o pirolito. Em garrafa maior, só tínhamos então as gasosas, mais caras.
Sérgio, serei um optimista incorrigível: estou a ver a garrafinha não vazia, não meia cheia, mas sim atestada até cima. À espera do meu dedo afiado, enfiado…»
[NOTA: Texto extraído de uma correspondência particular dirigida ao destinatário por Arsénio Mota.]
Sem comentários:
Enviar um comentário