O sol de dia, as estrelas
De noite, quantas que vemos!
Nacem delas, põem-se delas:
Olhamos mais que entendemos!
E a lua, fermosa entre elas,
Que se renova e reveza,
Ora um fio, ora mais chea,
Ora em sua redondeza,
Cada mês – com que certeza! –,
Semelha à da nossa aldea.
(Francisco Sá de Miranda)
*
Laurentina Cesariniana 2
Mestiços somos nós todos
e eu também
mestediços visigodos
tinham um palato a modos
não muito por aí além.
Mestiços somos nós todos
Judeus e mouros
E ainda bem
(Grabato Dias,
antologia de Manuel Ferreira no reino de Caliban III, Plátano Editora, 3º volume)
*
O CHICOTE E O CAFÉ
Numa roça,
Implacavelmente
O chicote traçou novo risco
Vermelho nas costas do contratado.
Já cansado
O capataz grita com desdém:
«É para que aprendas, minha besta!»
E limpou o suor na testa.
E todos foram na tonga[1]
Silenciosamente,
Levando nos ouvidos
Os silvos do chicote
Rasgando a pele do camarada.
Em Luanda,
Um senhor distinto
Depois de bem almoçado
Pede um café.
(Eliseu Areia)
Poesia angolana de revolta, antologia, organização Giuseppe Mea, Paisagem Editora, Porto.
*
ULISSES
Recusa, poeta, suster o vento em tuas mãos.
Impossível, e não é alimento da fome
tão romântica
que rói tua alma pouco a pouco.
Respira e vive,
suavemente.
Apaga as músicas da distância,
os sinais de dramas só-palavras,
a vida abúlica que nirvanas pensam dar-te!
Afasta-as, homem-poeta,
edifica de novo
o gesto livre,
do homem a suprema glória!
Te lembro palavras de Ulisses
a Circe, olímpica feiticeira:
O homem só é grande
Quando igual a si mesmo.
Arsénio de Bustos, heterónimo de Arsénio Mota, hoje com harmonia dentro, 1956)
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[1] Trabalho na plantação
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