Em Bustos as mulheres esfalfavam-se nos aidos. Em Freixo as hortas eram dos outros. Nem sempre havia jeiras. Em Bustos trabalhava-se ao Domingo. Não havia tardes ao sol a fazer renda. Havia tremoços à sobremesa de Domingo. A ceia, à semana, era escoado. Em Freixo, às vezes, “fresca da nova”, sardinha da Ti Chica, vendida à porta de casa e assada nas brasas vivas do lume. Em Bustos o jantar era ao almoço e o almoço madrugava.
A Srª Celeste, a vizinha, também não era de Bustos. Era gandaresa de Quiaios. O tempo escorria-lhe mais lento. Não que não trabalhasse. E muito. Ela é que tinha aquele jeito de o tender. Ela tinha uma lareira, um lar, como em Freixo se dizia, e dava-me bilharacos ao redor do lume. Uma palavra, um sorriso, uma bonança. Vez à vez. Vestia roupas escuras, a assentar-lhe a viuvez. As quatro filhas da Srª Celeste eram todas lindas e costuravam. O filho construía a vida pelas Franças.
– Srª Celeste, quer ir comigo ao cinema?
– Ao cinema? Há que vidas que não vou!
A fita era a “Francisca” do Manoel de Oliveira.
O salão, curioso no começo, ia serenando mais e mais. Desistindo.
O salão, curioso no começo, ia serenando mais e mais. Desistindo.
– Srª Celeste, se quiser, podemos ir.
– Não, o Domingo é o dia do vagar.
– Não, o Domingo é o dia do vagar.
Na tela navegava a mestria de Oliveira, baloiçava uma carruagem, como berço de menino, lançavam-se palavras ao vazio, colava-se a desgraça aos amores de Fanny Owen, pendia a morte sobre a vida, com tocata do além.
Ressonava um resistente a sono solto.
A Srª Celeste presa a Oliveira.
A tender o tempo.
Escrito por odete ferreira
A Srª Celeste presa a Oliveira.
A tender o tempo.
Escrito por odete ferreira
in amirgã
Episódio contado com leveza e nostalgia. É uma viagem ao tempo do borralho e dos cinemas de Bustos. Afinal Bustos é uma terra que recebeu muita gente de fora. Escreva mais
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