Foi grande o falatório sobre a reunião promovida pela Comissão de Melhoramentos, e a exaltação do prior, a ponto de ter dito que nada se podia fazer sem o seu consentimento e a sua participação. Entre o trabalho das vinhas, durante o jogo de cartas e do dominó, multiplicaram-se as críticas e os apartes, mas todos sabiam que o que o padre falara verdade. Ele não era apenas o líder espiritual da aldeia, também comandava os cordelinhos da política, não hesitando até em denunciar à polícia política as “ovelhas tresmalhadas”.
Nada se podia fazer contra a vontade de António Henriques Vidal que exigira um lugar à mesa. Inevitavelmente teriam que conciliar interesses. Diferentes, mas não antagónicos.
A Comissão de Melhoramentos queria homenagear os fundadores da freguesia, criar uma biblioteca, fundar um jornal, lutar pela instalação de uma casa de saúde, agitar consciências. O padre Vidal tinha outro objectivo, construir uma nova igreja. E sabia que só utilizando a seu favor a iniciativa, a energia, e a esmola de quem “não era frequentador da missa”, poderia lograr tal objectivo.
Jogou forte e claro na assembleia de 1 de Janeiro, sublinhando que não iria admitir iniciativas “independentes”. Os elementos da Comissão perceberam a mensagem, pois o pároco facilmente conseguiria proibir qualquer movimento, reunião ou homenagem. E os mais velhos logo se lembraram do ano de 1940, quando a festa do 18 de Fevereiro fora proibida pelo Visconde de Bustos, com o pretexto de que se podia ofender o povo da Mamarrosa.
O inevitável deu-se, e os festejos do 18 de Fevereiro de 1960 não só tiveram direito a missa, como contaram com a participação de dois padres, do presidente da Junta, Manuel Ferreira e do vereador da Câmara, Manuel dos Santos Vieira, todos ocupando lugar de destaque na mesa da sessão solene onde se homenageou Jacinto Simões dos Louros e Manuel dos Santos Pato.
O dia começou com uma salva matinal de 21 tiros. “Às 10,30 foi celebrada missa pelo pároco da freguesia, assistindo muito povo e as pessoas mais representativas do nosso meio” (…) “No final da missa, foi a romagem ao cemitério tendo tomado parte a irmandade de S. Lourenço”(1)
Jacinto Simões dos Louros, que tinha chegado a Bustos dois dias antes, participou na romagem e estranhou o ambiente religioso. Na ocasião nada disse, mas ficou de tal modo impressionado que, uns anos mais tarde quando escreveu as memórias, nas linhas dedicadas à homenagem de Bustos, apenas escreveu:
“Em 18 de Fevereiro de 1960 promoveu-se pela primeira vez a comemoração da criação freguesia em 1920, com um cortejo religioso ao cemitério em homenagem a todas as pessoas ali sepultadas.
Esse cortejo era justo mas devia de ser feito civilmente em homenagem aos republicanos, bem como a todas as pessoas que votaram o plebiscito favorável à criação da freguesia e até mesmo às pessoas que não podiam votar, mas que concordavam. Prestar homenagem a todos, inclusivamente aquelas pessoas que votaram contra, foi um autêntico contra senso. Eu discordei, nem logicamente podia concordar, muito embora no acto o não manifestasse, porque não quis ser desmancha-prazeres, como me poderiam alcunhar.” (2)
Pelas quatro da tarde, já com a presença de muito povo, no átrio do clube foram descerradas duas “lápides em honra de Jacinto Simões dos Louros, paladino e principal autor da criação civil da freguesia e do Dr. Manuel dos Santos Pato, paladino e autor da criação eclesiástica.” (3) Seguiu-se a sessão solene tendo falado: Dr. Assis Rei, Engenheiro Pato, Hilário Costa, Padre Rei (pároco da Moita), Vitorino Reis Pedreiras, Padre Vidal, Professor Pires, Jacinto Simões dos Louros e Dr. Manuel dos Santos Pato.
A sessão solene terminou com o discurso emocionado de Manuel dos Santos Pato, mas os trabalhos não terminaram aí.
A Comissão de Melhoramentos queria homenagear os fundadores da freguesia, criar uma biblioteca, fundar um jornal, lutar pela instalação de uma casa de saúde, agitar consciências. O padre Vidal tinha outro objectivo, construir uma nova igreja. E sabia que só utilizando a seu favor a iniciativa, a energia, e a esmola de quem “não era frequentador da missa”, poderia lograr tal objectivo.
Jogou forte e claro na assembleia de 1 de Janeiro, sublinhando que não iria admitir iniciativas “independentes”. Os elementos da Comissão perceberam a mensagem, pois o pároco facilmente conseguiria proibir qualquer movimento, reunião ou homenagem. E os mais velhos logo se lembraram do ano de 1940, quando a festa do 18 de Fevereiro fora proibida pelo Visconde de Bustos, com o pretexto de que se podia ofender o povo da Mamarrosa.
O inevitável deu-se, e os festejos do 18 de Fevereiro de 1960 não só tiveram direito a missa, como contaram com a participação de dois padres, do presidente da Junta, Manuel Ferreira e do vereador da Câmara, Manuel dos Santos Vieira, todos ocupando lugar de destaque na mesa da sessão solene onde se homenageou Jacinto Simões dos Louros e Manuel dos Santos Pato.
O dia começou com uma salva matinal de 21 tiros. “Às 10,30 foi celebrada missa pelo pároco da freguesia, assistindo muito povo e as pessoas mais representativas do nosso meio” (…) “No final da missa, foi a romagem ao cemitério tendo tomado parte a irmandade de S. Lourenço”(1)
Jacinto Simões dos Louros, que tinha chegado a Bustos dois dias antes, participou na romagem e estranhou o ambiente religioso. Na ocasião nada disse, mas ficou de tal modo impressionado que, uns anos mais tarde quando escreveu as memórias, nas linhas dedicadas à homenagem de Bustos, apenas escreveu:
“Em 18 de Fevereiro de 1960 promoveu-se pela primeira vez a comemoração da criação freguesia em 1920, com um cortejo religioso ao cemitério em homenagem a todas as pessoas ali sepultadas.
Esse cortejo era justo mas devia de ser feito civilmente em homenagem aos republicanos, bem como a todas as pessoas que votaram o plebiscito favorável à criação da freguesia e até mesmo às pessoas que não podiam votar, mas que concordavam. Prestar homenagem a todos, inclusivamente aquelas pessoas que votaram contra, foi um autêntico contra senso. Eu discordei, nem logicamente podia concordar, muito embora no acto o não manifestasse, porque não quis ser desmancha-prazeres, como me poderiam alcunhar.” (2)
Pelas quatro da tarde, já com a presença de muito povo, no átrio do clube foram descerradas duas “lápides em honra de Jacinto Simões dos Louros, paladino e principal autor da criação civil da freguesia e do Dr. Manuel dos Santos Pato, paladino e autor da criação eclesiástica.” (3) Seguiu-se a sessão solene tendo falado: Dr. Assis Rei, Engenheiro Pato, Hilário Costa, Padre Rei (pároco da Moita), Vitorino Reis Pedreiras, Padre Vidal, Professor Pires, Jacinto Simões dos Louros e Dr. Manuel dos Santos Pato.
A sessão solene terminou com o discurso emocionado de Manuel dos Santos Pato, mas os trabalhos não terminaram aí.
Logo depois, quase sem intervalo, iniciou-se a segunda sessão pública da Comissão de Melhoramentos. Foi então que Padre Vidal fez alinhar o reforço trazido de fora, o reverendo Alfredo Simões Rei. Este, depois de dirigir à Comissão várias perguntas, introduziu a questão da construção da nova igreja.
“Indicou que a igreja devia ser a que tinha primazia em virtude de já estar em vias de começo. Depois dirigindo-se ao povo fez-lhe esta pergunta: Qual das obras considereis de maior urgência e necessidade, a igreja, a casa de saúde, ou outro qualquer melhoramento?
O povo não se manifestou. Nova pergunta do padre. É a igreja que quereis construir? Apenas meia dúzia de vozes disseram sim. Esta manifestação foi sintomática, não resta dúvida” (3)
Uns dias depois lia-se no “Jornal da Bairrada” (1):
“Tem sido o assunto de maior interesse nos últimos dias. Agitado o problema pela Comissão de Melhoramentos vemos que o povo quer começar por onde deve, a sua igreja nova. Tanto a Comissão de Melhoramentos como a Comissão da Nova Igreja estão de mãos dadas para levar a cabo uma obra que há 40 anos espera.”
A manipulação tomava forma impressa, espalhava-se a notícia de que a construção da nova igreja era a prioridade da recém formada Comissão de Melhoramentos. Isto escrito pelo correspondente local do “Jornal da Bairrada.” O qual respondia pelo nome de António Vidal e era padre. Em Bustos.
Belino Costa
(1) Jornal da Bairrada, 27 de Fevereiro de 1960, pag4
(2) Jacinto Simões dos Louros, Notas e recordações da minha vida particular e política, pag106
(3) Vitorino Reis Pedreiras, livro de memórias, volume VI
“Indicou que a igreja devia ser a que tinha primazia em virtude de já estar em vias de começo. Depois dirigindo-se ao povo fez-lhe esta pergunta: Qual das obras considereis de maior urgência e necessidade, a igreja, a casa de saúde, ou outro qualquer melhoramento?
O povo não se manifestou. Nova pergunta do padre. É a igreja que quereis construir? Apenas meia dúzia de vozes disseram sim. Esta manifestação foi sintomática, não resta dúvida” (3)
Uns dias depois lia-se no “Jornal da Bairrada” (1):
“Tem sido o assunto de maior interesse nos últimos dias. Agitado o problema pela Comissão de Melhoramentos vemos que o povo quer começar por onde deve, a sua igreja nova. Tanto a Comissão de Melhoramentos como a Comissão da Nova Igreja estão de mãos dadas para levar a cabo uma obra que há 40 anos espera.”
A manipulação tomava forma impressa, espalhava-se a notícia de que a construção da nova igreja era a prioridade da recém formada Comissão de Melhoramentos. Isto escrito pelo correspondente local do “Jornal da Bairrada.” O qual respondia pelo nome de António Vidal e era padre. Em Bustos.
Belino Costa
(1) Jornal da Bairrada, 27 de Fevereiro de 1960, pag4
(2) Jacinto Simões dos Louros, Notas e recordações da minha vida particular e política, pag106
(3) Vitorino Reis Pedreiras, livro de memórias, volume VI
As placas descerradas no clube quando este foi demolido foram retiradas. Segundo Hilário Costa ficaram na posse de Manuel Joaquim dos Santos, que ao tempo fazia parte da Junta. É urgente recuperar essas placas que fazem parte de um património comum.
ResponderEliminarLembro-me bem do padre Vidal, que mais tarde foi considerado um heroi de Bustos, enquando outros verdadeiros herois foram esquecidos.
ResponderEliminarNa altura em que estive em Portugal nos anos cinquenta, este homem metia medo a muita gente. O meu pai teve problems com o padre Vidal, a quem chamavam o "Morcego Negro" porque tinha o hábito de andar a pé à noite para ver se estava tudo em ordem (ou por outra razão qualquer). Naquele tempo o padre de uma aldeia como Bustos era, de facto, uma pessoa com muito poder e uma pessoas que sabia tudo. Havia até quem dissesse que ele era informador da PIDE. Talvez um dia o "Notícias de Bustos" possa contar histórias sobre este homem.
Milton Costa
O padre Vidal marcou uma época de Bustos, desde logo pelos poderes de facto que detinha. Era um verdadeiro "controleiro".
ResponderEliminarTinha méritos, que não se questionam: empenhou-se na construção do novo templo e, sobretudo, visitava diariamente as almas doentes e os idosos. Neste aspecto, seguia as regras da Igreja, pois acompanhava e preocupava-se como o seu rebanho, seguindo as pisadas de Cristo.
E procurava acompanhar-nos, então jovens a despontar para o mundo. Obviamente, também para procurar controlar-nos, que as ideias de liberdade e democracia fervilhavam e ele eram um homem do regime.
O homem não me largava, na sua ânsia de converter um rebelde com causa, o que ele bem sabia e eu nunca lhe escondi.
Certo é que escapei dos apertos da PIDE, salvo no período revolucionário da crise de Coimbra (1969). Nesta altura já o poder do Padre Vidal começava a esboroar-se.