3 de outubro de 2011

BILIOTECA DE BUSTOS MOSTRA NATÁLIA CORREIA ... "uma mescla de anjo e demónio".


Os Grandes Portugueses na RTP, Natália Correia, Escritora/Poeta 1923/1993 aqui

Mulher forte, irreverente, contraditória – e de beleza extraordinária. Com intensa versatilidade, dedicou-se a vários géneros literários. Natália Correia sempre se recusou a ser uma figura decorativa, peça que encontrava e saía do palco segundo as regras da compostura. Ao longo da vida escreveu intensamente. E ainda marcou presença na política [na era do 25 de Abril foi deputada do PPD e independente] e na imprensa. A indignação foi uma constante na sua vida e obra – motivada pela censura que a amordaçava ou por uma insurreição natural a todos os engodos ideológicos da sociedade. “Uma mulher imperial”, diz a jornalista Clara Ferreira Alves.

Natália Correia é uma mescla de anjo e demónio Muito do seu encanto vem desta mistura explosiva. É conhecida pela sua personalidade livre de convenções sociais, vigorosa e polémica, que se reflecte na escrita. Poetisa, romancista, dramaturga, ensaísta, tradutora, conferencista, editora, deputada. “Em qualquer destes domínios lavrou e afirmou-se, numa inquieta busca de uma verdade, de um sentido estético e ético que perseguiu toda a vida”, refere Ana Paula Costa na “Fotografia de Natália Correia”

Fonte: Os Grandes Portugueses na RTP, Natália Correia, Escritora/Poeta 1923/1993 aqui









Defesa do Poeta

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Senhores jurados sou um poeta
um multipétalo uivo um defeito
e ando com uma camisa de vento
ao contrário do esqueleto.

Sou um vestíbulo do impossível um lápis
de armazenado espanto e por fim
com a paciência dos versos
espero viver dentro de mim.

Sou em código o azul de todos
(curtido couro de cicatrizes)
uma avaria cantante
na maquineta dos felizes.

Senhores banqueiros sois a cidade
o vosso enfarte serei
não há cidade sem o parque
do sono que vos roubei.

Senhores professores que pusestes
a prémio minha rara edição
de raptar-me em crianças que salvo
do incêndio da vossa lição.

Senhores tiranos que do baralho
de em pó volverdes sois os reis
sou um poeta jogo-me aos dados
ganho as paisagens que não vereis.

Senhores heróis até aos dentes
puro exercício de ninguém
minha cobardia é esperar-vos
umas estrofes mais além.

Senhores três quatro cinco e sete
que medo vos pôs por ordem?
que pavor fechou o leque
da vossa diferença enquanto homem?

Senhores juízes que não molhais
a pena na tinta da natureza
não apedrejeis meu pássaro
sem que ele cante minha defesa.

Sou um instantâneo das coisas
apanhadas em delito de paixão
a raiz quadrada da flor
que espalmais em apertos de mão.

Sou uma impudência a mesa posta
de um verso onde o possa escrever.
Ó subalimentados do sonho!
a poesia é para comer.

Natália Correia, "Poesia Completa", Publicações Dom Quixote,Lisboa, 2000, pág. 330 e seg.

Fonte: A serpenteemplumada aqui

Natália Correia - Defesa doPoeta


*
Natália Correia é a autora da letra do Hino dos Açores
___________
Outras fontes:
Biblioteca de Bustos;
Homúnculo Natália Correia, Livro pela capa
Humberto Delgado, República & Laicidade
Liberdade e Cidadania, Natália Correia
Norton de Matos, Almanaque Republicano

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