Celebramos hoje o quinquagésimo oitavo aniversário da freguesia de Bustos, que pela Lei n.º 942 de 18 de Fevereiro de 1920 se tornou independente da Mamarrosa, depois de uma luta para a sua independência.
1833 – Pela nova reforma do Código Administrativo foi criada a freguesia de Mamarrosa, nela sendo incorporado o ramo de Bustos. Não foi fecunda nem pacífica, talvez pelo espírito belicoso e espoliativo do povo da Mamarrosa, a sua vida em comum. Surgiram atritos a que Bustos reagiu com forte personalidade, ciente da sua razão, valor e maioria.
A Igreja tinha personalidade jurídica, lançava derramas que toda a freguesia pagava e só a sede da freguesia aproveitava.
1850 – Os enterros, que até agora se faziam nos templos e nos adros, passaram a ser feitos em cemitérios, só havendo um na Mamarrosa. Os péssimos caminhos existentes tornavam difícil e dolorosa a condução dos nossos mortos para o cemitério da Mamarrosa, o qual foi feito em local impróprio. Ali eram lançados em sepulturas, por vezes cheias de água, os corpos dos que a morte tinha ceifado. Confrangedor e arrepiante espectáculo!
Assim foi criando o povo de Bustos necessidade de sair deste ciclo, que o magoava, criando vida própria. Bustos teve a sorte de terem nascido no seu meio uma plêiade de homens valorosos, que mereciam que se escrevesse o seu nome com letras maiúsculas. Pelo fruto do seu trabalho e do seu saber, fizeram de Bustos uma terra próspera e ciosa dos seus direitos. A independência surgia em todos os espíritos fortes e ousados; Bustos foi escolhido para local de residência e comércio de um homem que se chamou Joaquim Duarte Sereno de Aguim, o qual trazia como riqueza um mundo de ambições, e sua mulher o seu bragal à cabeça. Estabelecido no melhor local de Bustos, onde nasceram seus filhos, foi um elemento de valor, que ajudou o progresso de Bustos.
1884 – Num crescer que não parava, impulsionado por estes homens fortes, vai dar-se o primeiro passo decisivo para a nossa independência, a criação, em 1884, de um cemitério de que tantos carecíamos. Acabou-se assim a tragédia de levar os mortos à Mamarrosa, criando-se um cemitério já de largas visões e em bom local.
O último quartel do século dezanove foi, sem sombra de dúvida, a hora das grandes realizações. Caminho-de-ferro, estradas a macadame, que se faziam pela primeira vez em Portugal, entusiasmaram os nossos conterrâneos levando António Francisco Pedreiras, numa pequena abertura política já que o seu partido não estava no poder, pois militava no partido regenerador, a fazer essa obra grandiosa, rasgando o Concelho com uma estrada que, nascendo na Ponte do vale de Bustos, vai terminar no final do concelho, na Ponte da Murta, num comprimento de mais de 15 quilómetros. As suas linhas ainda hoje são de admirar, pela beleza das suas rectas e da concepção do seu todo.
1905 – A sonegação das pratas – Embriagados com tanto porvir as nossas riquezas aumentam, o nosso agro é o mais bem tratado, os caminhos rasgam-se em todos os sentidos ligando-nos com todos os nossos vizinhos, onde íamos comprar grandes parcelas de terreno para nossa expansão e riqueza. Caminhando assim na vanguarda de todos os nossos vizinhos começámos com a exploração das areias do Sobreiro, fazendo adobos que vendíamos. Explorava-se, em parte, o calcário dos Penedos, o qual, embora em terra alheia, nos pertencia.
É nesta euforia, o que nos fere duplamente, que se dá a recusa e sonegação das alfaias religiosas, as quais pertenciam à freguesia e como tal vinham dar brilho e carácter religioso às Festas. Aconteceu porém, que a festa de Sto. António de Bustos coincidiu com a de Sto. António dos Covões, e como tal não fomos servidos e ainda fomos insultados, sobretudo os que lá foram para trazer as pratas. As tensões subiram ao extremo e o grito de independência surgiu.
Compraram-se as insígnias e foi criada a irmandade de S. Lourenço, que se tornou o padroeiro da futura freguesia; adquiriram-se as alfaias e paramentos de que necessitávamos, sendo esta a resposta dada àqueles que nos tinham negado o que nos pertencia e ainda por cima, nos tinham vexado. Estava vencida mais uma etapa para a nossa independência.
1907 – A Família Sereno – António Duarte Sereno tornou-se o 1º Visconde de Bustos no ano de 1907, por compra do título nobiliárquico, já depois de construído o seu palacete, tendo o caso sido muito festejado. O Senhor Visconde era o chefe político local e o maior do concelho. Não tinha competidores pois António Francisco Pedreiras já tinha falecido. Era ele quem comandava toda a política e o povo via nele um ídolo.
Por que é que o Senhor Visconde não nos separou da Mamarrosa? Porque não queria perder os amigos políticos que lá tinha. Em Bustos não havia ninguém que fosse capaz de o contrariar e assim continuámos na servidão.
1910 – A Implantação da República e Jacinto dos Louros – A implantação da República veio dar-nos um novo chefe político local, Jacinto dos Louros, que três anos antes, por dissidências com o Senhor Visconde, se tornara republicano. Jacinto dos Louros não tinha gente que o ajudasse, estava isolado, quase sozinho. Então isto era um feudo do Senhor Visconde. A Mamarrosa tinha mais republicanos que Bustos e estes moviam os cordelinhos a seu gosto e jeito.
A camaradagem republicana não deu os frutos que Jacinto dos Louros desejava e assim os nossos interesses e direitos eram absorvidos pela Mamarrosa. Não era Jacinto dos Louros fácil de vencer: começa por fazer ver que a Mamarrosa continuava a “cantar de galo” e foi ouvido por alguns logo seguido por outros que com ele pelejaram pelos nossos direitos, mas isso foi muito moroso. Só mais tarde conseguimos, por eleição, ter maioria na Junta como nos competia.
1915 – A Compra dos Sinos – A Nova Torre – Os anos agitados que se seguiram à implantação da República não fizeram parar a ambição de nos impormos, mostrando a nossa vontade. Compraram-se os sinos em 1915 e, embora a torre ainda não estivesse pronta, estes fizeram-se ouvir colocados no adro em cima de grossos paus. Construída a torre até às bocas dos sinos, para lá estes foram içados, ainda a torre não tinha cúpula. Só em 1918 é que a torre foi acabada terminando assim a última etapa da nossa persistente jornada.
1919 – Eleições para Deputados – Jacinto dos Louros, já então rodeado por gente nova, exige ao deputado pelo círculo, Dr. António Ferreira, a luta no Parlamento pela criação da freguesia de Bustos e faz com que todos votássemos com ele. E assim foi, com tanta sorte o fez que a Camâra, envolvida em assuntos de maior importância, não se opôs à proposta.
1920 – Estávamos de Parabéns – Bustos era freguesia – O povo, quase todo, agradeceu a Jacinto dos Louros o seu gesto dando-lhe visto nas próximas eleições. Subiu assim no conceito do povo, quer pelo Jacinto dos Louros quer pelos seus correligionários, gente nova e com vontade de vencer que trabalhava para a sua terra da melhor vontade. No primeiro aniversário houve festa rija, ruas engalanadas, duas músicas, muito fogo e grande arraial. Dois oradores, o Dr. Manuel das Neves e José Barata, discursaram ao povo.
Só um ano depois começaram a trabalhar para a criação da freguesia eclesiástica, tendo Jacinto dos Louros deixado para nós o acometimento. E assim, foram os republicanos que também deram alma e orientação à criação eclesiástica, tendo chamado a nós o Dr. Manuel dos Santos Pato que completou a criação e se tornou republicano e homem valoroso para Bustos.
Para finalizar quero lembrar os nomes de três homens já falecidos e que ainda não foram mencionados, são eles Manuel Francisco Rei, Manuel Francisco Domingos e Manuel Reis Pedreiras. Que o seu feito sirva de exemplo aos novos, trabalhando em prol da sua terra, que pela sua riqueza e valores demográficos merece o título de Vila.
Assim o espero eu e todos os conterrâneos.
Honra aos homens que pela sua terra deram o seu contributo.
Viva Bustos!
18.02.1978
VRP
1833 – Pela nova reforma do Código Administrativo foi criada a freguesia de Mamarrosa, nela sendo incorporado o ramo de Bustos. Não foi fecunda nem pacífica, talvez pelo espírito belicoso e espoliativo do povo da Mamarrosa, a sua vida em comum. Surgiram atritos a que Bustos reagiu com forte personalidade, ciente da sua razão, valor e maioria.
A Igreja tinha personalidade jurídica, lançava derramas que toda a freguesia pagava e só a sede da freguesia aproveitava.
1850 – Os enterros, que até agora se faziam nos templos e nos adros, passaram a ser feitos em cemitérios, só havendo um na Mamarrosa. Os péssimos caminhos existentes tornavam difícil e dolorosa a condução dos nossos mortos para o cemitério da Mamarrosa, o qual foi feito em local impróprio. Ali eram lançados em sepulturas, por vezes cheias de água, os corpos dos que a morte tinha ceifado. Confrangedor e arrepiante espectáculo!
Assim foi criando o povo de Bustos necessidade de sair deste ciclo, que o magoava, criando vida própria. Bustos teve a sorte de terem nascido no seu meio uma plêiade de homens valorosos, que mereciam que se escrevesse o seu nome com letras maiúsculas. Pelo fruto do seu trabalho e do seu saber, fizeram de Bustos uma terra próspera e ciosa dos seus direitos. A independência surgia em todos os espíritos fortes e ousados; Bustos foi escolhido para local de residência e comércio de um homem que se chamou Joaquim Duarte Sereno de Aguim, o qual trazia como riqueza um mundo de ambições, e sua mulher o seu bragal à cabeça. Estabelecido no melhor local de Bustos, onde nasceram seus filhos, foi um elemento de valor, que ajudou o progresso de Bustos.
1884 – Num crescer que não parava, impulsionado por estes homens fortes, vai dar-se o primeiro passo decisivo para a nossa independência, a criação, em 1884, de um cemitério de que tantos carecíamos. Acabou-se assim a tragédia de levar os mortos à Mamarrosa, criando-se um cemitério já de largas visões e em bom local.
O último quartel do século dezanove foi, sem sombra de dúvida, a hora das grandes realizações. Caminho-de-ferro, estradas a macadame, que se faziam pela primeira vez em Portugal, entusiasmaram os nossos conterrâneos levando António Francisco Pedreiras, numa pequena abertura política já que o seu partido não estava no poder, pois militava no partido regenerador, a fazer essa obra grandiosa, rasgando o Concelho com uma estrada que, nascendo na Ponte do vale de Bustos, vai terminar no final do concelho, na Ponte da Murta, num comprimento de mais de 15 quilómetros. As suas linhas ainda hoje são de admirar, pela beleza das suas rectas e da concepção do seu todo.
1905 – A sonegação das pratas – Embriagados com tanto porvir as nossas riquezas aumentam, o nosso agro é o mais bem tratado, os caminhos rasgam-se em todos os sentidos ligando-nos com todos os nossos vizinhos, onde íamos comprar grandes parcelas de terreno para nossa expansão e riqueza. Caminhando assim na vanguarda de todos os nossos vizinhos começámos com a exploração das areias do Sobreiro, fazendo adobos que vendíamos. Explorava-se, em parte, o calcário dos Penedos, o qual, embora em terra alheia, nos pertencia.
É nesta euforia, o que nos fere duplamente, que se dá a recusa e sonegação das alfaias religiosas, as quais pertenciam à freguesia e como tal vinham dar brilho e carácter religioso às Festas. Aconteceu porém, que a festa de Sto. António de Bustos coincidiu com a de Sto. António dos Covões, e como tal não fomos servidos e ainda fomos insultados, sobretudo os que lá foram para trazer as pratas. As tensões subiram ao extremo e o grito de independência surgiu.
Compraram-se as insígnias e foi criada a irmandade de S. Lourenço, que se tornou o padroeiro da futura freguesia; adquiriram-se as alfaias e paramentos de que necessitávamos, sendo esta a resposta dada àqueles que nos tinham negado o que nos pertencia e ainda por cima, nos tinham vexado. Estava vencida mais uma etapa para a nossa independência.
1907 – A Família Sereno – António Duarte Sereno tornou-se o 1º Visconde de Bustos no ano de 1907, por compra do título nobiliárquico, já depois de construído o seu palacete, tendo o caso sido muito festejado. O Senhor Visconde era o chefe político local e o maior do concelho. Não tinha competidores pois António Francisco Pedreiras já tinha falecido. Era ele quem comandava toda a política e o povo via nele um ídolo.
Por que é que o Senhor Visconde não nos separou da Mamarrosa? Porque não queria perder os amigos políticos que lá tinha. Em Bustos não havia ninguém que fosse capaz de o contrariar e assim continuámos na servidão.
1910 – A Implantação da República e Jacinto dos Louros – A implantação da República veio dar-nos um novo chefe político local, Jacinto dos Louros, que três anos antes, por dissidências com o Senhor Visconde, se tornara republicano. Jacinto dos Louros não tinha gente que o ajudasse, estava isolado, quase sozinho. Então isto era um feudo do Senhor Visconde. A Mamarrosa tinha mais republicanos que Bustos e estes moviam os cordelinhos a seu gosto e jeito.
A camaradagem republicana não deu os frutos que Jacinto dos Louros desejava e assim os nossos interesses e direitos eram absorvidos pela Mamarrosa. Não era Jacinto dos Louros fácil de vencer: começa por fazer ver que a Mamarrosa continuava a “cantar de galo” e foi ouvido por alguns logo seguido por outros que com ele pelejaram pelos nossos direitos, mas isso foi muito moroso. Só mais tarde conseguimos, por eleição, ter maioria na Junta como nos competia.
1915 – A Compra dos Sinos – A Nova Torre – Os anos agitados que se seguiram à implantação da República não fizeram parar a ambição de nos impormos, mostrando a nossa vontade. Compraram-se os sinos em 1915 e, embora a torre ainda não estivesse pronta, estes fizeram-se ouvir colocados no adro em cima de grossos paus. Construída a torre até às bocas dos sinos, para lá estes foram içados, ainda a torre não tinha cúpula. Só em 1918 é que a torre foi acabada terminando assim a última etapa da nossa persistente jornada.
1919 – Eleições para Deputados – Jacinto dos Louros, já então rodeado por gente nova, exige ao deputado pelo círculo, Dr. António Ferreira, a luta no Parlamento pela criação da freguesia de Bustos e faz com que todos votássemos com ele. E assim foi, com tanta sorte o fez que a Camâra, envolvida em assuntos de maior importância, não se opôs à proposta.
1920 – Estávamos de Parabéns – Bustos era freguesia – O povo, quase todo, agradeceu a Jacinto dos Louros o seu gesto dando-lhe visto nas próximas eleições. Subiu assim no conceito do povo, quer pelo Jacinto dos Louros quer pelos seus correligionários, gente nova e com vontade de vencer que trabalhava para a sua terra da melhor vontade. No primeiro aniversário houve festa rija, ruas engalanadas, duas músicas, muito fogo e grande arraial. Dois oradores, o Dr. Manuel das Neves e José Barata, discursaram ao povo.
Só um ano depois começaram a trabalhar para a criação da freguesia eclesiástica, tendo Jacinto dos Louros deixado para nós o acometimento. E assim, foram os republicanos que também deram alma e orientação à criação eclesiástica, tendo chamado a nós o Dr. Manuel dos Santos Pato que completou a criação e se tornou republicano e homem valoroso para Bustos.
Para finalizar quero lembrar os nomes de três homens já falecidos e que ainda não foram mencionados, são eles Manuel Francisco Rei, Manuel Francisco Domingos e Manuel Reis Pedreiras. Que o seu feito sirva de exemplo aos novos, trabalhando em prol da sua terra, que pela sua riqueza e valores demográficos merece o título de Vila.
Assim o espero eu e todos os conterrâneos.
Honra aos homens que pela sua terra deram o seu contributo.
Viva Bustos!
18.02.1978
VRP
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