30 de setembro de 2005

E VÃO 57 ... UDB EM FESTA

«Canecas e Gavetas
Fazem jogo limpinho;
Cuidado com os Canecas
– estão cheios de vinho!»
de ‘Bustos em Cuecas’, recolha de Arsénio Mota,
Bustos – elementos para a sua história, edição ABC, 1983
***
Em reacção à apatia provocada pelo encerramento imposto aos clubes de futebol, ‘Os Gavetas’ e seu mano-rico ‘Os Canecas’, o magma da alma de Bustos exsudou ‘União Desportiva’. As discussões e bulhas tantas vezes acontecidas entre irmãos deram lugar a um aperto de mão franco, consistente e duradouro. A fusão dos clubes partiu de gente nova, Dr. Assis Rei, Mário Reis Pedreiras, também conhecido por «Mário Vitorino»[1], Jorge Micaelo (1º médico do clube), …, Manuel Tavares da Silva [“o barateiro”, por parte do seu Pai) teria sido o principal artífice na construção do “União”[2].
À época, uma colectividade desportiva, para se constituir, tinha de ter um padrinho notoriamente grande. Herdeiro do Bustos Foot-Bool Club, o Futebol Clube de Bustos, [“Os Gavetas”], era filial do Futebol Clube do Porto e “Os Canecas” (Clube de Futebol Os Azuis de Bustos) era afilhado de “Os Belenenses”. Acontece que Manuel da Cruz Sérgio[3], um mecenas de mãos largas do clube de Belém e dos Canecas e compagnon de route dos plutónicos da fusão puxou a brasa para os Azuis das Salésias e a UDB ficou sua filiada.
As datas da fundação do “União” variam. Não deve ser alvo de contestação. Portugal, Reino independente, também não tem data da efectiva criação de reino independente. E se a tem, não é data muito importante para merecer a inerente celebração festiva.
O programa da passagem do testemunho do LVII Ano da UDB dedica a tarde do próximo dia 4 a uma confraternização desportivo-gastronómica e o “5 de Outubro” está reservado a um evento lúdico-cultural pela costa de prata e por terras do clube-padrinho, onde serão disputados dos jogos. Os benjamins – alvo da programação – por certo não esquecerão este aniversário O Dr. Fernando Vieira, presidente-director-treinador-médico e homem-dos-sete-ofícios, timoneiro da galera está de parabéns .
E a UDB merece ser acarinhada e apoiada para desenvolver o projecto de formação das classes jovens e manter a equipa de seniores na disputa do Campeonato distrital da 2ª divisão, na senda dos êxitos.
Sérgio Micaelo Ferreira
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PROGRAMA DO 57º ANIVERSÁRIO
UNIÃO DESPORTIVA DE BUSTOS

4 Outubro (terça-feira)
19H00 – Recepção das associações co-irmãs (ADNARIZ e GDAZURVA)
19H10 – Inauguração da placa alusiva à data
19H20 – Entrega de diplomas de mérito (ao pai do ano, ao treinador do ano, a adeptos por merecido reconhecimento, aos patrocinadores da UDB)
20H00 – Festa de confraternização com bolo e espumante

5 de Outubro – Dia de Feriado (Implantação da República)

06H00 – Partida dos Autocarros para Lisboa
09H30 – Visita turística a Cascais e Sintra
14H30 – Jogo de Iniciados entre “Os Belenenses” e a UDB
15H45 – Jogo de Juvenis entre Belenenses e Bustos
18H30 – Viagem de regresso.
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Outras informações:
1) A ocupação dos autocarros obedecerá ao seguinte escalonamento das prioridades: atletas das camadas de iniciados e juvenis, familiares dos atletas, outros atletas da UDB, que pretendam participar e finalmente a população em geral.
2) O preço da viagem 5,00€ para familiares dos atletas e associados da UDB; os restantes, 7,00€.
3) A UDB contactou o Hotel Marriott, em Lisboa, e o Hotel Atlantis, ao lado do autódromo, para local das refeições para os atletas.
4) Há ainda a possibilidade dos participantes também poderem almoçar no Hotel, num bufett preparado para a ocasião.
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Notas de rodapé

[1] Mário Reis Pedreiras é um dos grandes beneméritos da Freguesia, por exemplo: a) Desde há vários anos paga integralmente a renda do Campo de Futebol, via Junta de Freguesia. b) Comparticipou com avultada importância para a construção da Casa Mortuária implantada na "Praça Vermelha"- verba dividida em duas tranches. Acontece que até ao momento o senhor Presidente da Junta de Freguesia de Bustos não se dignou apor a sua assinatura em ofício de agradecimento dirigida a este benfeitor. L’État c’est Moi.
[2] Sendo escassos os registos escritos, já tarda a recolha de depoimentos de um período vivo desta passagem de Bustos na construção da sua História.

[3] Manuel da Cruz Sérgio, apesar de ter apoiado financeiramente os Azuis de Belém e de Bustos, pode ser considerado o “Mecenas Esquecido”. E há mais nomes a figurar ... Um trabalho para o Jó Duarte desenvolver ou outro(s) .

29 de setembro de 2005

GALERIA PRESIDENCIAL - 1

Jacinto Simões dos Louros – Manuel Francisco Rei – José Joaquim Simões dos Louros – Manuel Simões Micaelo Jr – Manuel dos Santos Vieira – João de Deus Simões Vieira – Assis Francisco Rei – Manuel Simões Ferreira Jr – Silvério Francisco Pedreiras.

GALERIA PRESIDENCIAL - 2

Hilário Simões da Costa – Alberto Oliveira Cruz – Isaura Vieira Liberal – Gil Simões Ferreira – Manuel Simões Luzio Jr – Narciso Paiva Cardoso – Albertino Marques – Manuel Conceição Pereira.

28 de setembro de 2005

JACINTO SIMÕES DOS LOUROS - DO CURRICULUM

Algumas funções desempenhadas
1910 (15.10)/1913 – Vereador da Comissão Administrativa da Câmara Municipal.
1914 (até Abril) – Vice-Presidente da Câmara Municipal
9.2.1919/8.05. 1920 – Presidente da Junta de Freguesia da Mamarrosa (1).
09.05.1920/31.12.1922 – 1º Presidente da Junta de Freguesia de Bustos (deu posse à nova Junta em 02.01.1923) (2).
*
(1) Dados recolhidos in Armor Pires Mota, Em Busca da História Perdida, edição da Câmara Municipal de Oliveira do Bairro, 1997 e Mamarrosa, Edição da Junta de Freguesia da Mamarrosa, 1993. O Autor limita o mandato de Presidente da Junta de Freguesia da Mamarrosa em 18.02.1920 (a data da criação da Freguesia de Bustos). Acontece que o Decreto nº 6.486, de 30 de Março de 1920, designa “o dia 9 do próximo mez de Maio para a eleição” da Junta de Freguesia de Bustos, “e bem assim para a eleição da nova Junta de Freguesia da Mamarrosa”.
(2) Transcrição da acta da 1ª Reunião da Junta de Freguesia de Bustos, em Sessão Extraordinária de 09.05.1920

“Acta de sessão extraordinária da Junta de Freguesia de Bustos em nove de Maio de mil novecentos e vinte. Presentes no edifício da escola do sexo feminino[1] deste lugar de Bustos os cidadão eleitos na [assembleia] de hoje Jacinto Simões dos Louros, Duarte Nunes Cipriano, Manoel dos Santos Rosario, Manoel Francisco Domingues Junior e Manoel da Silva Novo, tomada a posse como consta do respectivo auto exarado no livro competente, tomou a presidência o vogal mais velho Duarte Nunes Cipriano que declarou que esta reunião tinha por fim eleger presidente e vice-presidente e destinar os dias logar, digo, os dias local e hora das suas sessões ordinárias. Procedendo-se à respectiva eleição, observando-se todas as formalidades legais, foram eleitos por unanimidade para presidente o vogal Jacinto Simões dos Louros e para vice-presidente o vogal Duarte Nunes Cipriano, os quais tomaram os respectivos logares. Em seguida foi deliberado que de futuro as sessões ordinárias fossem nos primeiros e terceiros domingos de cada mez por nove horas neste mesmo edifício, devendo a primeira sessão ordinária efectuar-se no próximo domingo desasseis do corrente, o que tudo se fará publico por editais afixados na porta principal do edifício. E nada mais havendo a tratar na presente sessão foi esta encerrada, lavrando-se de tudo a presente acta que eu Constantino Nogueira da Silva[2], secretário escrevi. Tem uma entrelinha na página anterior que diz: ordinárias. Jacinto Simões dos Louros
Manoel Francisco Domingues Junior
Manoel dos Santos Rosario
Duarte Nunes Cypriano
Manoel da Silva Novo
*
[1] A escola era uma sala da casa implantada no prédio que hoje pertence ao Dr. José Tribuna.
[2] Professor Primário. Monárquico. Na mudança de regime, o professor desfilou com os seus alunos pelas ruas de Bustos, dando vivas à República. Episódio contado meu avô Francisco Ferreira

HOMENAGEM A CARLOS LUZIO

Livro de Carlos Luzio, “Pescador de Sonhos”
Dia 2.10.2005 (Domingo) – 17H00
Bustos – Palacete do Visconde

CONVITE

O nosso conterrâneo Carlos Luzio faleceu inesperadamente, no dia 27 de Setembro de 2004.
O Carlos era conhecido de todos, mas poucos sabiam que era poeta.
Um grupo de amigos prometeu-lhe financiar a publicação de um livro que as circunstâncias não permitiram que viesse ser publicado em vida.
O livro de poesia “Pescador de Sonhos”, com gravura na capa de (João) Martins Oliveira, agora editado, será apresentado em sessão pública, no próximo dia 2 de Outubro (Domingo).
Será igualmente evocado o primeiro aniversário do seu falecimento.
Convidam-se os amigos do Carlos Luzio e todos aqueles que gostam de desfrutar momentos de poesia a participar nas cerimónias.

Programa do próximo dia 2 de Outubro

(17H00) – Concentração junto à Biblioteca de Bustos (Adro da Igreja Velha)
(17H10) – ROMAGEM AO CEMITÉRIO
Será descerrada uma placa em homengem ao Carlos Luzio na sua sepultura e deposição de uma coroa de flores.

(18H00) – LOCAL: Palacete do Visconde – Auditório da Associação de Beneficência e Cultura de Bustos (ABC)
APRESENTAÇÃO DO LIVRO “Pescador de Sonhos,
Uma análise, por Michelle Mota.
***

Emília Aires, Milton Costa, Óscar Santos, Sérgio M. Ferreira

27 de setembro de 2005

18 DE FEVEREIRO DE 1960 COM HOMENAGENS

Os grandes obreiros da criação da Freguesia de Bustos (Lei nº 942/1920, 18 de Fevereiro) e da Paróquia de São Lourenço de Bustos (?decreto 7 de Março de 1925), respectivamente.

Transcrito de Bustos – Memórias de um bustoense, Hilário Costa. 1984.
NOTÍCIAS DE BUSTOS

(do Jornal da Bairrada)
No dia 18 de Fevereiro, comemorou-se o 40º Aniversário da fundação da freguesia de Bustos, tendo nessa data sido separada de Mamarrosa.
Foi um dia de muita alegria para o povo desta linda e progressiva terra onde sempre um fervor bairrista notável.
À tarde, no «Centro Recreativo», foram descerradas duas lápides com os nomes dos srs. Jacinto Simões dos Louros, que criou a freguesia de Bustos, civilmente, e dr. Manuel dos Santos pato que criou religiosamente.
Por tal motivo foram estes ilustres bustoenses homenageados numa sessão solene, onde discursaram, enaltecendo as suas obras, os srs. Dr. Assis Rei, Engenheiro Pato, Vitorino Reis Pedreiras, Hilário Costa, Padre Vidal e Professor Manuel António Pires. Tendo os srs. Jacinto Simões dos Louros (1) e dr. Manuel dos Santos Pato agradecido, muito sensibilizados, a homenagem que lhes foi prestada.
– Foi criada uma «Comissão de Melhoramentos de Bustos», que esperamos possa contribuir para que esta terra progrida e se embeleze mais e muito mais. – C (2).
Na minha opinião [escreve Hilário Costa]:
A lápide, com os nomes dos nossos ilustres conterrâneos, que já fazem parte da história de Bustos, que foi retirada do Clube local e se encontra na posse do sr. Manuel Joaquim dos Santos, que ao tempo fazia parte da Junta de Freguesia, deve ser colocada no Salão Nobre do palacete em dia apropriado, mas o mais breve possível. (3)
...
(1) Arsénio Mota, então secretário e estratega da Comissão de Melhoramentos, assistiu a um episódio ocorrido quando Jacinto dos Louros discursava. Aguardamos os pormenores.
(2) Em 1960, o Correspondente do Jornal da Bairrada era o P.e António Vidal que à data andava às voltas com a construção da igreja, actualmente a merecer obras de conservação]
(3) Vitorino Reis Pedreiras registou o retrato de Jacinto dos Louros e da época . A Junta de Freguesia que vier a seguir deve dedicar alguma atenção à acção das primeiras Juntas de Freguesia, para manter vivo o imaginário de uma terra pequena, mas bairrista com vinca o correpondente do Jornal da Bairrada.

JACINTO DOS LOUROS:BUSTUENSE, REPUBLICANO E LAICO

1963
Janeiro, dia 13, segunda-feira.

Foi hoje a enterrar Jacinto Simões dos Louros, em Ílhavo, pelas cinco horas da tarde. A notícia da sua morte foi recebida ontem, cerca das sete horas, e logo me pus em comunicação com o Sr. Dr. Manuel dos Santos Pato, sobre as disposições a tomar, uma vez que lhe tínhamos feito a promessa que o seu corpo seria sepultado em Bustos.
As impressões do Sr. Dr. Pato eram de que ele ia ser sepultado em Ílhavo na campa da sua mulher. No entanto eu não queria que a minha promessa ficasse em pouco, e fui logo de manhã até Ílhavo (apesar de estar chuvoso) falar com a família.
Chegado, procurei falar com os seus, mas não foi possível apesar de procurados. Soube que estavam na capela do hospital, onde o finado se encontrava e de lá sairia o funeral.
Fui para Aveiro passando de novo em Ílhavo, tendo então falado com os familiares de Jacinto dos Louros, oferecendo-lhes o cumprimento da minha palavra, e a de outros amigos, para que ele, grande amigo de Bustos, fosse aqui sepultado.
Eram, talvez, duas horas, já parte de família se encontrava junto do finado. Depois de dar os pêsames a todos os presentes falei com o Dr. Manuel Guerra, único filho varão do falecido, que me agradeceu a oferta para que seu pai fosse sepultado em Bustos, como era seu e nosso desejo, mas que outros motivos poderosos impediam concretizar esses desejos. As razões e motivos que impediam a transladação do cadáver é não terem ainda mausoléu para nele depositarem o corpo, como ainda a gravidade do momento político que passa.
Regressei a Bustos procurando reunir e levar a Ílhavo alguém que pudesse prestar as devidas homenagens àquele a quem Bustos tanto deve.


PORMENORES BIOGRÁFICOS

Jacinto dos Louros era órfão de mãe ao nascer pois esta faleceu no parto. Dois anos depois seu pai emigrou para o Brasil, deixando-o ao cuidado da sua irmã Rosa que era solteira e a quem foi confiado o amparo e a educação do Jacinto. Seu pai veio a falecer, no Brasil, dois anos mais tarde o que motivou que a tia Rosa fosse o seu único amparo. Esta tia passou a viver com o seu irmão, João Simões dos Louros, casado com Madalena dos Reis, tia do autor desta pequena biografia.
Naqueles recuados tempos em que a literatura e a instrução eram apanágio de poucos Jacinto dos Louros evidenciou-se começando por ser comerciante de ovos. Com esta missão vai até Lisboa, aí se estabelecendo no mesmo comércio. Depois chama para seu empregado e mais tarde sócio seu primo Manuel com quem tinha sido criado. E assim resultou o estabelecimento definitivo de Manuel na capital onde arranjou fortuna e onde ainda reside. Jacinto dos Louros, pelo contrário, acabou por regressar.
Acontece que pelo ano de 1906, com a criação da primeira escola feminina, veio para Bustos uma professora oriunda de Ílhavo. A nova professora não passou despercebida pela sua beleza natural e ainda pela forma inteligente e carinhosa como exercia a sua nobilíssima profissão. Estes predicados atraíram Jacinto dos Louros e em breve se consorciaram.

ENFRENTA O DÉSPOTA

Naquele tempo Bustos estava praticamente subordinado ao Visconde de Bustos, titulo adquirido em 1907, cujas vontades e caprichos, por vezes disparatados, eram sempre aceites como bons. E embora nem todos os aceitassem como certos ou sérios, ninguém se atrevia a enfrentar o “alto senhor” ou discordar das suas atitudes. Apenas um o fez e esse foi Jacinto dos Louros.
Era costume, todos os dias à noite, reunirem-se no estabelecimento do Visconde os homens mais representativos de Bustos e, quase sempre, a política fazia parte da cavaqueira. A monarquia e os seus dois grandes partidos, Progressista e Regenerador, debatiam-se no estertor das suas agonia. Naquele tempo a expressão da palavra era livre e a imprensa fazia largos comentários sobre o momento político.
Jacinto dos Louros nem sempre estava de acordo com o amigo Visconde e este não aceitava qualquer discordância. Às discussões seguiu-se a discordância total e por fim o corte de relações.
Enfrentar a ira do homem, que era um déspota, viria a trazer grandes dissabores como de facto aconteceu. Sindicâncias à sua mulher com o fim de ser irradiada da Escola de Bustos, insultos de toda a ordem, coisa tão em voga naqueles tempos.
A sindicância não produziu os seus efeitos mas parte da sua casa foi incendiada e tudo levou a crer que foi obra da “Camarilha”.
Não era Jacinto dos Louros homem que se intimidasse mas é certo que quase toda a gente o olhava com rancor. Uma vez implantada a Republica começou a ser o chefe local e como tinha o poder nas mãos começou a ser mais respeitado, apesar da maioria do povo o odiar. Pouca gente tinha como amiga.

UM POLÍTICO …

Fez parte da primeira vereação republicana do concelho e como vereador começou a trabalhar em prol de Bustos. Tempos depois os monárquicos começaram a conspirar abertamente contra a República, o que motivou algumas prisões entre elas a do Visconde de Bustos e dos seus lugares tenentes. Prisões que se mantiveram por alguns meses em Aveiro.
A sanha feroz contra o Louros aumentou, responsabilizando-o por tais prisões. Mas eles não estavam inocentes porque o atentado contra a Corte do Pano, chefiada pelo padre Maneta, teve como ajudante o colaborador fiel do Visconde, Matos Ala.

Naqueles tempos, em que Bustos era um ramo da freguesia da Mamarrosa, os nossos interesses eram prejudicados em favor da sede da Freguesia e sempre com o apoio do Sr. Visconde que tinha lá os seus amigos. No entanto, devido à sua coragem, Jacinto dos Louros defendia sempre a sua terra e as demonstrações de paladino dos nossos interesses trouxeram-lhe mais alguns amigos.
A grande aspiração do povo de Bustos era a sua separação da Mamarrosa, com quem não se sentiam bem porque eram muito prejudicados, e porque Bustos tinha todos os valores e requisitos para ser uma nova freguesia. Apoiado agora por um maior número de amigos, na maioria gente nova, Jacinto dos Loures assume tal aspiração lutando e conseguindo a criação da nova freguesia. A sua criação teve lugar no Parlamento em 18 de Fevereiro de 1920 por proposta do deputado de Aveiro António Costa Ferreira, residente em Oliveira do Bairro.
Tal feito, que a Jacinto dos Louros se deve, granjeou-lhe muitas simpatias, com excepção do Sr Visconde e dos seus mais ferrenhos seguidores.

…MUITO GENEROSO

O primeiro aniversário da criação da freguesia foi solenemente festejado com duas bandas de música, muito fogo e as ruas ornamentadas. À tarde, no arraial, discursaram dois grandes oradores, Dr. José Barata e Manoel das Neves. Apesar de ser uma festa muito simpática, mesmo assim, houve gestos pouco harmoniosos por parte da comitiva do Visconde de Bustos, sempre arruaceiros e malcriados.
Pode dizer-se que todo o povo de Bustos viveu intensamente o acontecimento porque a “emancipação” era a nossa maior aspiração.
Jacinto dos Louros obsequiou, em sua casa, todos aqueles que ele julgava paladinos da nossa causa. Todas as despesas inerentes à criação da nova freguesia foram por ele custeadas. Quero aqui lembrar alguns nomes que trabalharam e se esforçaram para que Bustos fosse freguesia:
Manoel Francisco, Manoel Reis Pedreiras, Manoel Rosário, António Carvalho, Manuel da Costa Morgado, Manoel Correia da Silva, Miguel Morgado, Manoel Cipriano, Duarte Nunes Cipriano, Manoel Nunes Pardal, António Vieira, Alfredo Barreiro, Manoel Francisco Domingues e tantos outros que trabalharam com afinco para a nossa inteira emancipação.
Nas primeiras eleições todos foram dar o seu voto ao homem que com o seu esforço e o apoio de alguns tinha criado a freguesia de Bustos.

OBRIGADO A PARTIR

O primeiro passo foi o mais difícil e na verdade o que mais valor tinha, mas faltava ainda a separação eclesiástica. Houve que encetar os primeiros passos para esta nova realização e é então que o autor destas linhas redige um memorando a sua reverendíssima o Sr. Bispo Conde de Coimbra.
A forma expressa, despida de um português de Lei, no entanto encerrava os nossos veementes desejos e as nossas razões para a inteira independência de Bustos. O abaixo-assinado foi subscrito por 95 por cento e a nossa pretensão foi patrocinada pelo Sr. Dr. Manoel dos Santos Pato que a fez prevalecer junto da Diocese, e sua Reverendíssima deu despacho favorável à nossa petição.
Tal facto viria a consumar-se dois anos mais tarde mas Jacinto dos Louros, fiel aos seus princípios, nunca interveio nestes assuntos. Tornou-se o chefe político local sabendo atrair a si os jovens. Mas a vida tem as suas exigências e Jacinto dos Louros, para melhor educar os seus filhos, vai para Ílhavo onde a sua mulher fora colocada. Vende então a casa, sita na rua de Bustos, e deixa Bustos definitivamente.

Fizemos-lhe uma despedida afectuosa acompanhando até aos limites da nossa freguesia o amigo. que com tanto desinteresse serviu a sua terra, que levou no coração.
Seus filhos, em número de cinco, todos se educaram tendo o seu filho varão tirado um curso superior.
Afastado da sua terra, umas vezes em Ílhavo outras no Porto, sempre que encontrava gente de Bustos sentia um grande prazer em conversar procurando saber notícias da sua terra por quem tanto pelejou e sofreu.
Tive ocasião de o visitar no seu leito de sofrimento. Impossibilitado de falar, mas de espírito lúcido, sentia prazer de nos ver mostrando-nos na sua expressão o grande amor a Bustos e à República.
Convém lembrar aqui a manifestação de apreço e gratidão que o povo de Bustos, na comemoração do aniversário da criação da Freguesia lhe tributou no Cine-Bustos, englobando também a figura muito ilustre e de grande benemérito que é o Dr. Manoel dos Santos Pato.
No acto foram descerradas duas placas no átrio do Cinema, lugar que achei impróprio e a razão está à vista, é que pouco depois, por motivo de obras, as lápides foram retiradas.

O FALECIMENTO

Jacinto dos Louros tinha uma prodigiosa memória, conversador a toda a prova, aproveitava sempre que podia, ou quando encontrava alguém que fosse de Bustos para falar de assuntos relacionados com a política e com a sua terra.
Era o mês de Agosto, ia para a praia (Costa Nova) onde tinha sempre gente conhecida para as suas cavaqueiras. E no final do mês de Agosto de 1961 deixou os amigos para ir assistir ao funeral de António Luís Gomes, único sobrevivente do primeiro governo republicano, a quem ele quis prestar a sua homenagem. O sol e a emoção sofrida deram origem a um ataque que o paralisou, impedindo-lhe para sempre o uso da fala. Deste ataque veio a falecer, já com cerca de 85 anos.

O seu funeral, que foi civil, saiu da capela do Hospital de Ílhavo numa carreta dos bombeiros e lá foi a enterrar na sepultura de sua mulher, já falecida. Apesar do mau tempo o cortejo foi regular e de Bustos foi muita gente.
Assim baixou à terra um homem intemerato, defensor da República, amigo da sua terra, a qual nunca esqueceu. Os Republicanos de Bustos ofereceram-lhe um bouquete de flores rubras e eu, pessoalmente, também. Devido à situação política não houve discursos junto à sepultura, com desgosto para mim que tinha pensado dizer algumas palavras em honra do grande amigo de Bustos.

Vitorino Reis Pedreiras

26 de setembro de 2005

JACINTO DOS LOUROS: UMA FOTO PARA A GALERIA PRESIDENCIAL

Na sala de sessões da Junta de Freguesia há uma parede com a galeria fotográfica dos presidentes. Todos lá têm o respectivo retrato, todos menos o Presidente/Fundador, Jacinto dos Louros, que é ali lembrado por uma placa (foto). Na ausência de qualquer registo fotográfico foi essa a solução de recurso encontrada.

Não só falta a fotografia como nunca foi publicada biografia ou qualquer texto revelador da vida e percurso político do homem que fez frente ao poderoso Visconde de Bustos e foi eleito presidente nas primeiras eleições livres e democráticas (9-05-1920) realizadas na nossa terra.

Tal lacuna está prestes a chegar ao fim.

Amanhã publicaremos a fotografia de Jacinto dos Louros acompanhada por um texto que narra a vida atribulada do homem – órfão de mãe à nascença, tendo o pai emigrado para o Brasil de onde nunca mais voltou – que conseguiu transformar o desamparo e infortúnio em força. Não só fez frente aos poderosos do seu tempo como foi o grande obreiro do sonho de gerações, a emancipação política de Bustos e a sua separação da Mamarrosa. É um interessante e revelador testemunho (escrito em 1963) retirado do diário de Vitorino Reis Pedreiras.

Encontrar uma fotografia de Jacinto dos Louros estava a transformar-se numa missão impossível até que no passado mês de Junho bati à porta de Adélio Martins dos Reis e Dorinda Vieira dos Reis, no Sobreiro. O Sérgio dissera-me que o Adélio tinha herdado do pai o livro de actas da União Liberal de Bustos e perante tal notícia (a União Liberal é a organização fundadora do movimento associativo bustuense) não resisti a ir ver e consultar tão importante documento.

O Adélio e a Dorinda receberam-me com a simpatia de sempre e logo prometeram oferecer ao “Notícias de Bustos” uma cópia do Livro de Actas da União Liberal o que nos permitirá, logo que possível, divulgar um pouco da história da organização que, em tempos salazarentos, tinha por finalidade “organizar e acompanhar enterros civis”.
No decorrer da conversa aproveitei para lhes falar da dificuldade em encontrar um familiar de Jacinto dos Louros que pudesse ter uma fotografia do seu antepassado. Ao escutar o meu desabafo logo a Dorinda ripostou: “ Mas eu conheço uma neta do Jacinto dos Louros com quem costumo conviver quando estou na Costa Nova. De certeza que ela nos arranja uma foto do avô.”

De facto assim aconteceu e, semanas mais tarde, Adélio dos Reis entregou-me a foto que iremos publicar amanhã. Mas, simultaneamente, teve o cuidado e sentido cívico de ir entregar na sede da Junta da Freguesia outro exemplar, para que a galeria fotográfica dos Presidentes fique, finalmente, completa.

Belino Costa

23 de setembro de 2005

U.D.B: 5 DE OUTUBRO NO RESTELO

Na data do seu aniversário, a 4 de Outubro, a União Desportiva de Bustos vai oferecer aos seus atletas um presente diferente. A direcção vai levá-los ao estádio do Restelo, para jogarem com o Belenenses.
Esta iniciativa deve-se à continuidade do protocolo de cooperação existente entre o Belenenses e as suas filiais, para a apresentação de jovens valores, com chances de progressão desportiva, sendo avaliados por uma equipa técnica específica das camadas jovens do Belenenses.
Os jogos estão agendados para dia 5 de Outubro, no estádio do Restelo. Às 14.30 horas com os iniciados e às 16 horas, com os juvenis, onde irão participar também, previamente seleccionados, atletas do Nariz e do Azurva, clubes associados ao Bustos.
A comitiva parte pelas 6 horas do dia 5, de frente ao campo do Bustos, em dois autocarros de 50 lugares, e ficará alojada no Hotel Atlantis, junto ao Autódromo do Estoril.
Está previsto um passeio turístico a Cascais e Estoril, e uma visita guiada à famosa pastelaria onde se produz os pastéis de Belém.
Quanto à parte desportiva, será acertado, naquela data, o protocolo de acompanhamento e recrutamento de atletas do escalão de iniciados e juvenis da região Centro que, anualmente, a 5 de Outubro, serão levados ao Belenenses.

Entende a UD Bustos, mais uma vez pioneira em soluções, que deve proporcionar aos seus atletas, condições de exibirem o seu talento em locais próprios, de forma equilibrada e equidistante, e não mais permitir o aliciamento imoral que os seus jovens atletas sofrem com promessas mentirosas de progressão desportiva por clubes regionais.
Qualquer adepto pode participar na comitiva. Para isso deve contactar a direcção, de segunda a sexta-feira, após as 18 horas, e aos sábados e domingos, a partir das 9 horas, no campo de futebol.

F.V.

AZURVEIRA – LARGO DA CAPELA EM MOVIMENTO

(Clicar sobre a gravura, para obter ampliação)
Em consequência da reclamação do Eng.º Neo Pato, a Junta de Freguesia pôs “mãos à obra” e já lá está construído o Muro, a que designei, da prepotência, pelos contornos que envolveu a ocupação abusiva de uma faixa de propriedade privada.
Na sequência do serviço de implantação, a Junta de Freguesia de Bustos pediu a cedência de mais uma fatia de terreno e perante a resposta favorável, o muro foi prolongado, entrando no “Caminho do Ribeirinho”. Erro emendado com vantagens para a Azurveira (e não Azurbeira).
Segundo informação recente, pretende-se alargar o recinto da Capela de Nossa Senhora dos Emigrantes. Um grupo(?) de cidadãos está apostado na compra de uma parcela de terreno necessária à ampliação do Largo.
A autarquia local não está envolvida. Este alheamento da Junta de Freguesia causa alguma perplexidade.
Se o executivo (CDS) de Bustos fez um arranjo no largo e construção de nova capela de S. João – do toledo – ainda que tenha destruído uma capelinha com histórias, se comprou o terreno na Póvoa para alargamento do Rossio e construção de jardim e de uma segunda capela de N. Sr. dos Aflitos, porque motivo a Junta de Freguesia não adquire o terreno necessário ao alargamento do largo da Capela de Nossa Senhora dos Emigrantes?
Temo que a discriminação seja regra de actuação do actual executivo e que possa ser camuflada com a introdução no programa eleitoral o “Alargamento do espaço da Capela”, à semelhança da “Construção do Bairro do Cabeço” que ficou para as calendas.
Sérgio Micaelo Ferreira

22 de setembro de 2005

ARSÉNIO MOTA - 50 ANOS DE ESCRITA (COERENTE) - EM LIVRO (coordenação de Serafim Ferreira)

Copiado do blogue da(o) CAMPO DAS LETRAS aqui
Arsénio Mota - 50 anos de escrita - Serafim Ferreira (Coordenação)
Este livro é uma espécie de memória descritiva de um itinerário intelectual singular e coerente, como o testemunham muitos dos depoimentos pessoais daqueles que desejaram colaborar nesta iniciativa. [...]

PREÇO : €11.34

Preço de Mercado : €12.60 (Poupa €1.26)

Sobre o Livro :
Muito variada tem sido a obra literária de Arsénio Mota (nascido em Bustos – Oliveira do Bairro, em 1930) ao longo de cinquenta anos, repartidos pela poesia, conto, narrativa, crónica, estudos literários, jornalismo e histórias para crianças. É uma obra que se fez livro a livro, entre muitos sonhos e anseios, trabalhos e canseiras, durante os muitos anos que tem vivido no Porto, ainda que sempre com os olhos postos na sua Bairrada natal. Este livro é uma espécie de memória descritiva de um itinerário intelectual singular e coerente, como o testemunham muitos dos depoimentos pessoais daqueles que desejaram colaborar nesta iniciativa. A presente edição pretende sobretudo assinalar os “50 anos de escrita” de Arsénio Mota que passam em 2005. (Serafim Ferreira)
[A CAMPO DE LETRAS ME PERDOE A INTROMISSSÃO em alterar a fisionomia do texto]
Colaboração de
  • Agostinho Santos
  • Alfredo Martins
  • Alfredo Oliveira e Sousa
  • Álvaro Gomes
  • António Augusto Menano
  • António Jorge Tavares
  • Armando Pereira da Silva
  • Armor Pires Mota
  • Avelino Rocha
  • Carlos Braga
  • Emerenciano
  • Fátima Matos
  • Fernando Cardoso
  • Idalécio Cação
  • José Manuel Mendes
  • Leonel Cosme
  • Luís de Miranda Rocha
  • Luiz Francisco Rebello
  • Manuel Augusto Rodrigues e Alice Correia Godinho Rodrigues
  • Maria Alegria F. Marques
  • Pires Laranjeira
  • Ramiro Teixeira
  • Sara Reis da Silva
  • Vergílio Alberto Vieira
Referências críticas
  • Taborda de Vasconcelos
  • António Rebordão Navarro
  • Joaquim Correia
  • Álvaro Salema
  • Artur Portela Filho
  • Alexandre Pinheiro Torres
  • Júlio Conrado
  • Nuno Teixeira Neves
  • Óscar Lopes
  • Ramiro Teixeira
  • Miguel Serrano
  • Leonoreta Leitão
  • Pires Laranjeira
  • José Jorge Letria
  • José António Gomes
  • Luís de Miranda Rocha
  • Arnaldo Saraiva
  • Serafim Ferreira
  • Cidália Alves
  • Clarice Lisboa
  • Sara Reis da Silva
Outras informações:
ISBN: 9726109679
Nº de Páginas: 172
Peso: 390 g.
Dimensões 15.5x24 cm
Ano de Edição: 2005
...
(Fim do copianço e adaptação)
Notas de rodapé:
[1] A lista está recheada de combatentes vencedores do isolamento imposto pela folha em branco, escrita ou ilustrada.
[2] Um abraço a Arsénio Mota, pela persistência e coerência perseguida no uso do teclado, pelas janelas que conseguiu abrir e pelo arco-íris construído no livro.
[3] Mais que a homenagem, os leitores merecem ter acesso fácilitado ás obras de Arsénio Mota.
[4] A Serafim Ferreira . Os parabéns pela carolice empenhada na construção de um marco do caminho "marítimo" da literatura portuguesa.
srg

GOSTARIA DE ESTAR AÍ

Caro Arsénio,

Agradeço o convite para o lançamento do livro “Arsénio Mota – 50 Anos de Escrita”. Bem gostaria de estar aí no Porto, poder partilhar contigo tão significativo momento, mas mais do que os quase trezentos quilómetros que nos separam são as grilhetas do trabalho que me tramam e impedem de estar presente. Como queria. Como devia.

Mas não me vou açoitar em penitência, nem repetirei os lugares comuns da presença em espírito ou pensamento, essa etérea ubiquidade que nos permite, tal como a Deus, estar em todos os lugares ao mesmo tempo. Não vou porque não posso, o que lamento, quanto ao resto continuarei a não acreditar em Deus, até porque é um fraco argumento para justificar a existência.

Gostaria de estar aí, de te ver atrapalhado no meio dos abraços, os olhos tentando disfarçar o ror das emoções, mas sempre sereno, ponderando cuidadosamente cada adjectivo. Gostaria de te olhar com a cumplicidade de quem partilha este estranho amor pelas palavras e depois tratar-te por Você e por Senhor.
E perante o teu protesto pedir desculpa, mas não sem verberar esse impulso de te olhar com respeito e admiração. Porque és mais do que o homem e o escritor, és Bustos.

Você, Senhor Arsénio Mota, é a minha terra natal, é parte de uma identidade fundadora, mais profunda do que a noção de lugar e família. Porque sendo lugar e família é também a expressão dos valores que nos enformam, o cimento que tudo consolida.

Com palavras. Com palavra.

Gostaria de estar aí mas não posso, sou refém das minhas circunstâncias. Perdoa a minha ausência. Mas prometo que nos iremos encontrar em Bustos, os corações prontos a sentir, os olhos abertos à beleza do que é banal. E se for caso disso iremos ao Carlos, até porque certas conversas exigem a cadeira de um bom barbeiro.

Até lá. Até já.

Recebe um abraço amigo do

Belino Costa

ARSÉNIO MOTA – 50 ANOS DE ESCRITA

Este é o título do livro que vai surgir nas livrarias, nos meados do corrente mês, editado pela Campo de Letras, do Porto, com o patrocínio da Fundação Engº. António de Almeida, numa iniciativa do escritor e jornalista, Serafim Ferreira, em jeito de merecida e justa homenagem.
A propósito, Arsénio Mota confessa que, “dentro da minha modéstia habitual, que é a forma da minha sinceridade, acredito que o que neste acto se manifesta é puramente a prodigalidade enorme dos amigos e companheiros que me contemplam”. É que, para o homenageado, “no ambiente cultural que conhecemos e em que vivemos, um acto cultural desta estirpe enaltece claramente quem o promove mais do que a figura que parece motivá-lo”.


O volume abre com a introdução e visão geral da biografia deste escritor bairradino, ao mesmo tempo que inclui testemunhos pessoais de “26 amigos e companheiros de percurso nas letras e jornalismo”. Quatro destes 26 são artistas plásticos. (Emerenciano, Armando Pereira da Silva).
Colaboram no livro, entre outros, os escritores e poetas José Manuel Mendes, Luiz Francisco Rebelo, Fernando Cardoso, Pires Laranjeira, Vergílio Alberto Vieira, Manuel Augusto Rodrigues, Alice Correia Godinho Rodrigues, Maria Alegria F. Marques, Joaquim Matos, Avelino Rocha, Agostinho Santos, Alfredo Martins, Álvaro Gomes, António Augusto Menano, António Gomes Marques, Leonal Cosme, Ramiro Teixeira, Sara Reis daSilva; e da Bairrada/Gândara, Idalécio Cação, Luis de Miranda Rocha, Carlos Braga e Armor Pires Mota. A apresentação do livro que, como o título indica, pretende assinalar, muito justamente, meio século de actividade literária de Arsénio Mota, vai realizar-se, no próximo dia 23, às 21.30 horas, no auditório da Fundação Engº. António de Almeida (Sita na rua Tenente Valadim), Porto, onde Arsénio Mota espera “a roda-viva de abraços fraternos, para mim, tão grata e emocionante ao ponto de se tornar o maior galardão que poderia almejar após cinquenta anos de actividade literária”.

in Jornal da Bairrada

21 de setembro de 2005

JÓ DUARTE RECUPERA BEM


Submetido a intervenção cirúrgica ocorrida no dia 19, 2ª feira, Jó Duarte encontra-se bem disposto. O post-operatório está a evoluir favoravelmente.
O Jó recebe visitas entre as 14H00 e as 20H00, no IPO – Coimbra; Serviço de Cirurgia-Internamento; 3º Piso; Enfermaria 9; cama 41.
O NB deseja uma rápida convalescença e que esteja para breve o regresso do Jó ao convívio da família e amigos.
Aguardamos os relatos do Jó sobre os jogos da UDB.
Até breve.
srg

ELEIÇÕES NO INÍCIO DO ESTADO NOVO - 1935 (RESULTADOS PRÉ-FABRICADOS)

Com a devida vénia, copiado do blogue "ABRUPTO", aqui
(Clicar, para ampliar a imagem)


20.9.05
(JPP)
INTENDÊNCIAEm actualização, mais que necessária, os ESTUDOS SOBRE O COMUNISMO.Coloquei aí um índice final dos capítulos do III volume da biografia de Álvaro Cunhal.


(JPP)
VIAGENS NO TEMPO
Uma das descobertas do Estado Novo foram as viagens no tempo. Este exemplo inédito de 1935 revela como é possível escrever uma "notícia" antes dela ter acontecido, prática muito comum nos dias de hoje em que se "antecipa" o que vai acontecer, anter de ter acontecido. Pelos vistos, já havia mestres no tempo do dr. Salazar desta actividade típica do jornalismo imaginativo: Carmona eleito com "colossal" votação, antes da votação.
Sempre a aprender com o passado.
(Agradeço a M.L.E. a oferta deste e doutros papéis.)

(JPP)

20 de setembro de 2005

ARSÉNIO MOTA - 50 ANOS DE ESCRITA

Livro em apresentação
Arsénio Mota - 50 anos de escrita
.
Evento a realizar no Auditório da
Fundação Eng.º António Almeida
(Rua Tenente Valadim, 325 – Porto)

dia 23 de Setembro, 6ª feira, às 21H30,

E conta com um painel de apresentadores que integra
José Luís Pires Laranjeira, Álvaro Gomes e Ramiro Teixeira.

(Esta iniciativa tem o apoio da Fundação Eng.º António Almeida)
___________
Os escritores do concelho de Oliveira do Bairro,
Armor Pires Mota (Oiã) e Carlos Braga (Palhaça),
participam no livro com os seu depoimentos. (srg)

RETALHOS DO TROVISCAL

HORA DE CINZA.ÁGUEDA

Posted by Picasa
É tempo de meio silêncio
(Carlos Drummond de Andrade)

18 de setembro de 2005

NOTíCIAS DO BRASIL

Por vezes chegam-nos mensagens em busca de informações. Foi assim que no passado mês de Agosto, através de um comentário, nos chegou o seguinte pedido:

“Sou de Belo Horizonte, capital de Minas Gerais, no Brasil. Meu nome é Éder Simões. Cheguei ao seu blog através do Google, em busca de informações sobre Oliveira do Bairro, Bustos, Azurveira, o endereço que meu avô colocava em suas cartas para a família, aí em Portugal. Seu nome era Manuel Simões Loureiro. Ele veio para cá no final do século XIX e nunca mais voltou a Portugal. Uma de suas irmãs foi casada com um senhor cujo sobrenome era Rito Novo. Estou em busca de informações sobre pessoas da família que ainda morem aí na região. Poderia me dar alguma indicação? Algum endereço de blog de Azurveira? Ficaria muito agradecido por qualquer ajuda que me pudesse prestar.”

Recentemente Éder Simões enviou-nos mais pormenores sobre os familiares bustuenses:

“Meu avô nasceu em 1880 e veio para o Brasil, segundo me disse, com 16 anos, ou seja, em 1896, em companhia de um primo, de que nunca tive qualquer notícia. A razão de sua vinda foi exactamente a orfandade em que ficou com a morte do pai, e a miséria em que certamente passou a viver sua mãe e as duas irmãs. Através da Internet, pedindo os registros de Simões Loureiro no Google, vi que por volta de 1900 um certo João Simões Loureiro emigrou de Azurveira para os Estados Unidos. É possível que o grupo familiar fosse maior e que tenha se dispersado pelo mundo por força da emigração. A padroeira da localidade é Nossa Senhora dos Emigrantes, não é isto?... Como já lhe disse, uma das irmãs de meu avô se casou com Manuel Rito-Novo. Sei que este Manuel serviu no Exército Português em Angola, durante a I Guerra Mundial. Depois disto, veio ao Brasil, ficando hospedado em casa demeu avô, em Rio Acima, aqui perto, durante algum tempo. Essa família Rito-Novo ainda existe por aí? Penso ir a Portugal em algum momento. Se for, irei visitar Bustos e Azurveira em busca de mais informações. Mas gostaria de receber outras novidades antes disto, se por acaso lhe chegarem às mãos.”

Entre os nossos leitores haverá alguém que possa ajudar Éder Simões a localizar os seus antepassados?
Quem tiver informações pode divulgá-las nos comentários ou enviar um e-mail (bustos@sapo.pt) que será devidamente reencaminhado para o Brasil.

Entretanto podemos conhecer um pouco de Éder Simões que, assinando como Tristão, dinamiza um blog (http://sarapalha.blogspot.com/) que merece uma visita atenta. O Éder Tristão não só divulga o que há de melhor na literatura brasileira e portuguesa como escreve, e muito bem, como se comprova no texto que publicamos mais abaixo.

b.c

“BOA CONCEIÇÃO”

Gosto muito do parágrafo de Missa do Galo, de Machado de Assis, em que o narrador lança uma dosagem máxima de veneno sobre a personalidade de Conceição, a senhora, em cuja casa se hospedava, com quem manteve uma célebre conversação numa certa noite de Natal, quando tinha apenas dezassete anos.“Boa Conceição! Chamavam-lhe “a santa”, e fazia jus ao título, tão facilmente suportava os esquecimentos do marido. Em verdade, era um temperamento moderado, sem extremos, nem grandes lágrimas, nem grandes risos. No capítulo de que trato, dava para maometana; aceitaria um harém, com as aparências salvas. Deus me perdoe, se a julgo mal. Tudo nela era atenuado e passivo. O próprio rosto era mediano, nem bonito nem feio. Era o que chamamos uma pessoa simpática. Não dizia mal de ninguém, perdoava tudo. Não sabia odiar; pode ser até que não soubesse amar.”

Acho bom destacar o trecho do contexto em que ele se situa, para desvinculá-lo dos problemas de credibilidade desse narrador, o sr. Nogueira, perdido entre as ilusões de óptica produzidas pela memória, e pelo estado de excitação retrospectiva em que se encontra, e os condicionamentos que sobre ele actuavam no momento mesmo em que ocorriam os fatos relatados.
Destacá-lo do contexto para tomá-lo em sua natureza simples de verdade moral e psicológica, fruto de uma observação atenta e aguda das estratégias comportamentais do bicho humano.
Parece que esta é a máscara preferida dos políticos. A de não ser contra, nem a favor, muito antes pelo contrário, desde que, agindo assim, nada arrisquem, nada possam perder, podendo, de forma oposta, tudo ganhar. Isto é, ganhar o apoio e o aplauso gerais. É o caso de quem busca ser simpático a todos, o tipo que Nélson Rodrigues fulminou com a frase: Todo sujeito simpático é um canalha. É aqui que mora toda a canalhice dos políticos. Parece que as pessoas ignoram esta verdade fundamental da Ética – que a autenticidade precede em valor a opção pelo bem ou pelo mal. Que o mais perverso criminoso, capaz de assumir a sua preferência, é um ser eticamente superior àqueles que ficam em cima do muro, tentando tirar vantagens dos dois lados. Nem assumem de peito aberto a prática do grande mal, nem renunciam às pequenas perversidades do dia-a-dia. Como não se entregam à marginalidade ostensiva, podem posar de bons moços e de homens sérios. Mas são seguramente os piores. Daí o medo que tenho dos “homens sérios”. Deles zombo e busco fugir.
De cara, o bandido assumido já traz uma superioridade potencial. Como é capaz de pular decididamente para um dos lados do muro, se algum dia resolver ir para o lado do bem, ele o fará também com toda nitidez.Parece ser este o fundamento da frase do Apocalipse, que os crentes acreditam ser a fala do próprio Deus: Porque não és frio nem quente, eu te vomitarei de minha boca. Ou seja, fosses frio ou quente, não importa, não te deitaria fora. Não vem tanto ao caso que sejas bom ou mau, vale mais que não sejas uma mentira ambulante; que sejas moeda verdadeira, cheque com lastro monetário.Há um outro ponto bastante gostoso de se considerar: os riscos que correm igualmente os que pulam para um ou outro dos dois lados do muro.
A opção pelo bem é tão perigosa quanto a escolha do mal. Porque a grande maioria, preferindo a indefinição, tem como inimigos iguais os optantes, a turma da verdade comportamental, os amantes da autenticidade, irmãos siameses da mesma fraternidade – a dos respeitadores da sacralidade da ética, seja para afirmá-la, seja para transgredi-la, sem temor do conflito com muitos, sem a pretensão dos louvores de todos.
Tristão
http://sarapalha.blogspot.com/

13 de setembro de 2005

UM INSOLENTE DISLATE



O livro da Mestre Ana Paula Assunção, Oliveira Rocha no Coração da Bairrada, é um valioso contributo para a compreensão da degradação que atingiu em Portugal a concessão de graus académicos em alguns estabelecimentos de ensino superior. Custeado e distribuído pela C. M. de O. do Bairro, o volume destina-se a justificar a recuperação do edifício da antiga cerâmica, para nele se instalar o Museu de Olaria e Grés da Bairrada, mas, a ser lido, obteria o efeito diametralmente oposto.

Embora totalizando apenas dez por cento do livro, o texto autoral é ainda em grande parte simples verbo-de-encher. Um terço da extensão global da sua extensão global não vai além de transcrições e citações, que, sempre exorbitantes, apresentam inúmeros erros de leitura e em nada iluminam o assunto em discussão, sendo com frequência totalmente a despropósito. Como trabalho académico, é uma rematada fraude.

O luxuriante grafismo, de uma riqueza que mesmo grandes colecções de arte raramente têm merecido, e aqui constituído por banalíssima correspondência comercial, formulários oficiais e documentos notariais, tudo sempre a cores, apenas mascara grotescamente a escassez da investigação e a infantilidade das conclusões. O texto careceu totalmente de revisão, topando-se a cada passo sinais de um desleixo só compreensível em quem, colocada a tempo inteiro na Câmara de Loures, percorre o país de norte a sul a esfolar os patos-bravos em mais dois ou três municípios.

Mas o grande escândalo verifica-se ao nível da prosa, verdadeiramente deplorável. A autora desconhece em absoluto o conceito de parágrafo, o que transforma o seu texto num amontoado caótico de notas sem desenvolvimento, por falta do domínio técnico da sintaxe. Quando se arrisca a construir um período mais complexo, mete-se em emaranhados tais e tantos (a ela e ao pobre leitor) que nunca mais deles se desenvencilha. Os erros grosseiros de concordância (é lançado uma taxa, p. 68; o interesse que os levaram, p. 10; “Esta geografia […]. Constituem”, p. 86; “A rede comercial […] contribuem […] e perspectivam”, p. 86), e de regência (as matrizes “datadas desde a fundação”, p.139; “propicia com”) enxameiam um arrazoado pretensioso e sem sentido. A falta de consistência de tempos verbais é aflitiva (dentro do mesmo período encontramos “produziria”, “encerrará”, “possuía”, “deu”, p. 107), o pleonasmo involuntário, a figura recorrente (“a fábrica fabrica”, p. 76; “Para produzir verniz salino especial, este é produzido”, p. 71; “de leitura elegível”, p. 50, duplamente um erro; “informação não elegível” (referente à produção no ano de 1953), p.128; “conhecimento da fábrica que não desconhecia”, p. 44; “uma expectativa que se espera”, p. 138; “a base da sua essência”, p.138; “sensações para os sentidos”, p.139). Os exemplos dados são apenas uma pequena amostra dos que povoam todo o texto. “Cada cavadela, cada minhoca!”, como diz pitorescamente o povo!

Um passo, entre dezenas, que ilustra bem o método, o estilo e a (total ausência de) seriedade da investigação, que caracterizam o livro da Mestre Ana Paula Assunção, encontra-se na página 78, e surge depois da atrapalhada “leitura”, essa sim quase ilegível (e não “elegível” como escreve a autora), de uns mapas estatísticos referentes à produção no ano de 1952.

Lê-se, então, a fazer a transição para um texto que se encontra 2 páginas depois. Em vez de “fornecedores” seria mais próprio dizer “fornecimentos”:

Falemos agora das outras matérias também essenciais, como os fornecedores de lenha, carvão, sal, madeiras, óleos, transportes (76, destaques da autora).

E duas páginas (preenchidas com 16 gravuras) depois, numa sintaxe que é típica de todo o volume:

Pode-se afirmar a existência de uma fidelidade de fornecedores e, como veremos, o mesmo quanto a compradores.
Por exemplo, João de Pinho dos Reis Neves, armazenista retalhista de sal, na rua dos Arrais, próximo à Praça do Peixe em Aveiro, vende sal a 60$00/kg.
A Fábrica de Cerâmica de O. Bairro compra ás toneladas.
Também, a Pascoal & Filhos, Lda., Aveiro, a Viúva de António Oliveira Rocha adquire “ressalga de bacalhau” (78, destaques da autora).

A grande tese aqui defendida, não se sabe com que intuito, é a da fidelidade a fornecedores (e não de fornecedores) e de compradores. Vejamos, contudo, como (não) fica demonstrada a fidelidade, por exemplo, ao fornecedor de sal, material utilizado na vidragem das peças cerâmicas. Reproduz-se uma única factura e o correspondente recibo, numa página que contém mais três facturas referentes a fornecimento de tábuas (poderiam ilustrar a página 82), irrelevantes, portanto, para a questão do sal. A própria leitura da factura do sal contém um erro clamoroso: 60$00 é, não o preço por quilo, mas o preço por tonelada!, uma pequenina diferença. A referência à situação geográfica da firma aveirense não resulta, aliás, de qualquer pesquisa, senão que se pode ler no próprio recibo.

Depois vem a idiota irrelevância da observação “A Fábrica de Cerâmica de O. Bairro compra ás toneladas”, com o seu acento agudo em “às”. Por fim, e para confirmar a fidelização, a referência a um outro fornecedor! E porque não explicar que “ressalga” é sal que já foi utilizado, e, por isso mesmo, é muito mais barato, não influindo esse facto no processo de vidragem em que é utilizado?
A factura que documentaria o outro fornecedor, porém, não é reproduzida. Em seu lugar, e a encher a página seguinte, a reprodução de duplicados de correspondência com três diferentes fornecedores de lenha, no espaço de dois anos!!! O que quererá significar fidelidade?
Quanto à fidelidade ou não dos compradores, não sei como se pode lá chegar pela simples análise do acervo documental da fábrica. Como saber que determinada firma comprava determinado produto exclusivamente à Cerâmica Rocha só pela leitura dos documentos desta? Aliás seria falência certa.

Isto não se trata de uma distracção, de alguma coisa mais que ali estivesse escrita e que desapareceu electronicamente. É este, do princípio ao fim, o teor das teses e o estilo que lhes dá expressão.

Para os mais curiosos, ou os mais incrédulos, aí fica um pequeno florilégio, um cestinho de pérolas apanhadas ao acaso, a fazer inveja à longa colecção de bushismos que circula mundialmente na Internet. Os itálicos sublinham a duplicação de erros. A pontuação, os espaços entre parágrafos e os destaques em negrito são da responsabilidade da autora:

1. [Transcrição de um passo do testemunho oral de Joaquim Silva: nota-se uma grande empatia]
“- Descabecei a primeira pranchada, a segunda, desci para baixo e levei a 2a pranchada. Todos me diziam: “é pá, tu guarda a força que ela ainda te vai faltar.”
Depois voltei. Tinha o calor e um homem e por cima a pranchada, a 3a (124).

2. [Os operários chegam a desintegrar-se!]
Ao fim de tantos anos de laboração onde os pés e as mãos já sabiam de cor as curvas a realizar para não caírem nem deixarem cair o trabalho, vêem finalmente as recomendações para um corrimão nunca existente, entre o” salão” e os fornos (64).

3. [Exemplo de moderna oração relativa]
[…] circunstâncias que [o museu] pode viver naturalmente mas em que raramente atenta nelas (139).

4. [De ficar com os olhos em bico]
Cabe bem aqui a referência ao Mestre Feliciano de Almeida de quem se pode concluir ter sido um dos mais experimentados trabalhadores, a excepção a confirmar a importância de uma elite de operariado e que rapidamente o fixou como o Mestre incontestado e, como tudo, com razões e desrazões mas, frise-se, indispensável para o começo ou continuidade deste projecto industrial.
Inequivocamente, um homem conhecedor do trabalho e dos rapazes que ao longo de muitos e muitos anos lhe foram passando pelas mãos [honi soi].

Inequivocamente a ligação do trabalho, do domínio das matérias-primas e das mãos - uma raiz de artesão indiscutível - vindo ele de Almas de Areosa com a oportunidade industrial a instalar-se agora, em Oliveira do Bairro (28).

5. [Atente-se na frase entre parênteses: boa para combater a insónia a tentar decifrar]
Conforme uma memória mais ou menos consistente e por todos partilhada em Oliveira do Bairro, a grande oposição familiar vai obrigar António a adquirir a fábrica aquando da cessação da sociedade com Abílio e os restantes irmãos (para isso vai solicitar apoios financeiros locais e o Mestre Feliciano vai contribuir para, pelo seu valor como conhecedor do trabalho, se lhe abrir a porta para contar, com o apoio incondicional da família Tavares de Castro, a qual lhe empresta o dinheiro necessário para comprar a sociedade); empurra-o, para realizar uma escritura ante nupcial, para salvaguardar o património que, pode-se aceitar, era visto e entendido como sendo também de toda a família Oliveira Rocha (35).

6. [De ler três vezes e ficar na mesma. A vírgula no primeiro parágrafo aumenta a confusão: será que o engenheiro da CP também negociava em seguros, antiguidades, etc.?]
Ernesto Oliveira Rocha é engenheiro dos caminhos-de-ferro portugueses. Confirmam as pesquisas de terreno, haver paragem obrigatória para o Sr. Engenheiro descer mesmo no apeadeiro junto à estação. Não se fixou na vila.

Da mesma forma que Abílio, que ia e vinha, comerciante estabelecido em Vila Nova de Gaia, seguros, antiguidades e preciosidades era o seu ramo (29).

7. [Com esta tirada a autora atinge o clímax da perspicácia, conseguindo demonstrar aquilo que o limitado Villaverde Cabral, coitadito, nunca tinha conseguido: a comunhão de interesses entre o capitalista e o trabalhador: para uma marxista, não está mal.]
A relação que os seus habitantes e próximos [?] vão ter com a fábrica é de uma semi-proletarização: reproduziam [incoerência de tempos verbais] a sua força de trabalho a nível da exploração agrícola familiar e vendiam-na, pelo menos parcialmente, na fábrica. Não se trata de um verdadeiro ilhéu industrial, [não é outra coisa!] parafraseando Manuel Villaverde Cabral, mas antes o resultado, a continuação de um carreiro de industrialização, uma vez que a grande região da Bairrada, se prolonga com Aveiro e Porto; atrevemo-nos, por isso, a propor este projecto lançado por antigos artesãos, uma elite com capitais já acumulados (seja de conhecimento, seja de relações, seja de contactos, ...) como uma boa exemplificação dessa junção de interesses industriais e camponeses, a dualidade nunca verdadeiramente confrontada ou combatida. Até hoje.
É, quanto a nós, esta a situação que se vai propiciar com António de Oliveira Rocha (33).

8. [E prossegue, sem perder o fôlego, expondo uma das teses mais brilhantes de todo o volume] A relação que vai estabelecer localmente, integrando-se na vida da terra e das suas pessoas, é um processo de sociabilização que acabará por lhe trazer não apenas a aceitação como industrial como também o respeito local [casando com uma pobre assalariada analfabeta, como já a seguir se lê] e, ao conhecer e aprofundar “razões do coração” com uma mulher, Alexandrina Alves, definitivamente se integrou na História de Oliveira do Bairro.
O casamento de António e Alexandrina não ficou isento de ser criticado. Nesta matéria, as questões e opiniões familiares vão fazer-se sentir: a origem humilde de Alexandrina, o seu trabalho de acartar barro à cabeça, depois a limpeza do escritório, o seu analfabetismo, tudo isso vai configurar uma reacção negativa por parte da família Oliveira Rocha (33).

9. [A transcrição exemplar dum mapa estatístico, tornada quase ilegível]
Fornos e muflas 4 fornos intermitentes com alimentação manual, com 1 câmara, três com 25 fornadas durante o ano, com a capacidade de 100 m3; 1 forno intermitente com 36 m3, fazendo 1 fornada ano. Forno contínuo Hoffmann, alimentação manual com 114 m3 de capacidade, 2 câmaras, 6 fornadas durante o ano.
Máquinas produtoras 2 máquinas de moldação de tubos de grés, com 800 peças produzidas por 8 horas de trabalho, cada; 2 prensas mecânicas de balancé ou de fricção, produzindo 700 peças produzidas por 8 horas de trabalho;2 prensas ou fieiras mecânicas para manilhas, 21.000 e outra 1.200 peças por 8 horas de trabalho; 2 rebatedeiras manuais de tijolo, cada uma produzindo 4.600 tijolos; 19 rodas manuais de oleiro
(128).

10. [A utilização passa a ser um material, os numerais ganham estatuto de substantivo próprio e os novos mercados “vêem” (outra vez!) provocar quebra de interesse; a rematar, uma verdadeira girândola de asneiras]
A utilização do grés foi durante bastante tempo o material de predilecção dos construtores civis e urbanizadores. Na década de Sessenta aparecem novos mercados e experiências, nomeadamente dos Estados Unidos que vêem provocar alguma quebra de interesse neste material […] (101).

11. [Sem comentários]
O seu material constitutivo é praticamente indestrutíveis os esgotos construídos com ele são inalteráveis e duradouro (101).

12. [A fábrica produzia “áreas”, e uma garrafa vazia cheia de água quente era óptima para aquecer os pés]
Uma das produções que também não pode ser esquecida é a importante área de engarrafamento de genebra e licores que, em particular da zona da Bairrada, tinha nesta fábrica e na qualidade do seu material uma óptima resposta para as suas necessidades específicas.
Popularmente, também estas botijas se associam a uma outra função, a de aquecimento: uma garrafa vazia, com água quente aquecia tão bem uma cama nos dias frios de inverno! (109).

13. [Com em vez de em; valorizou em vez de valorizaram: expressão emproada de um pensamento indigente]
Se falámos das boas condições e do contexto de oportunidade com que este projecto se desenvolveu, se já se valorizou, num conceito amplo [vulgo, “pela rama”], as matérias primas requisitadas para o funcionamento da fábrica, é agora o lugar certo para a entrada em cena de alguns testemunhos […] (110).

14. [Bancos, seguradoras e bolsas assumem agora o poder político! (Afinal tudo quanto se diz do Doutor Salazar é pura invenção). Mas não consta que a empresa tivesse recorrido ao crédito bancário ou estivesse alguma vez cotada na bolsa de valores]
Como já se referiu, também, a localização da fábrica, - a estrada municipal, o caminho-de-ferro - aproximava as zonas de produção do poder político, com as instituições bancárias, seguros, bolsas (112).

15. [Lapalisse não diria melhor]
A vida e é era feita de altos e baixos, de dificuldades, de prazeres, de alegrias e tristezas, de vidas fechadas ou abertas ao sonho (115).

16. [A subtil leveza das informações pairando algures entre o começo e o princípio do trabalho; mas haverá sempre a possibilidade de registar os registos. “Outros […] histórias” também não fica bem]
As informações recolhidas são apenas um começo do muito trabalho que nos aguarda para inserir na fábrica os quotidianos a que assistiu.

Considerou-se apenas como sendo um princípio. Decerto que haverá espaço para registo dos muitos outros registos e histórias que não tivemos condições para ouvir e partilhar neste primeiro passo para reerguer a Fábrica de novo (116).

17. [O milagre da multiplicação dos quilos: de facto são 72 toneladas!]
Consumo de combustíveis, ou seja, quilos consumidos nas máquinas carvão mineral estrangeiro 72.000 t.- (132).

18. [Se uma pessoa se senta é porque se tenta: outra prolixa leitura da informação contida num quadro estatístico]
Quanto ao número de operários, são declarados ao INE e outras instituições similares maioritariamente recebendo ao dia ou semana, mas as informações recolhidas apontam para o mensal; pode-se considerar que o número de trabalhadores não se alterou substancialmente ao longo dos anos, mantendo-se com pequenas flutuações num número de cerca de 70 pessoas, alargando-se a partir de Sessenta o número de pessoal administrativo ou técnico, onde se inserem os gerentes (132).

19. [É, de facto, nestas tiradas prenhes de substância, que o talento da Mestre Assunção atinge alturas olímpicas]
Mas, acima de todas estas possibilidades, colocar a Pessoa perante si própria em discurso directo com os Outros, e ver-se com e neles nessa mesma dimensão de Ser (138).

20. [Duas orações subordinadas, sem oração principal!]
A mais valia que se deve a tantos homens e mulheres, jovens e idosos que nos possibilitaram e possibilitam outros modos de vida (138).

21. [Investigações no terreno permitem à historiadora antecipar de um ano a implantação da República, e um ritmo que regista todas as crises acaba por mudar de registo ao passar pelo labirinto das construções]
Contudo...O ritmo de solicitação de pedidos de licença para construção em Lisboa, registando as crises de 1892, 1909 (mudança de regime), o conflitos mundial que não propiciou o investimento nesta área da construção de casas, só começa a registar uma inversão de investimento quando se começa a estabilizar o escudo e a ser controlada a inflação (91).

22. [Pode parecer que a fábrica também chegou a fabricar fitas de aço para cuja produção comprava matéria-prima no Porto: mas é pura ilusão auditiva]
Para as fitas de aço, a Fábrica comprava esses produtos a Estores Sombreia de Joaquim Peixoto Alves & Cª, Lda. do Porto (83).

23. [Parece que não aprendeu a lição que ela própria transcreve na legenda de uma das gravuras da página 71, onde se pode ler que o vidrado se obtinha “pela introdução de sal na câmara de cozedura do forno”, e não pela sua mistura com a argila]
Aguada de Cima, Almas da Areosa, são alguns dos locais identificados como fornecedores de boa argila gorda, para misturar com sal de ressalga e produzir bons produtos de grés (67).

24. [Afinal a nossa investigadora já anda por aqui desde 1987! E a fábrica nunca foi nacionalizada!]
Em 1 de Setembro de 1987, tomamos conhecimento de uma vistoria às instalações da Fábrica Rocha, Lda. da Delegação Regional de Coimbra […] (61).

E pronto. Aí fica mais um monumento oco, obsceno e caro, à vaidade insaciável do Sr. Presidente a Câmara, sempre ávido de assinar mais um prefácio a um livro que lhe faço a justiça de pensar que não leu, mas que bem caro pagou com o dinheiro dos contribuintes. Parece que a autora o convenceu a candidatar este livro a um prémio nacional. Se ninguém o ler, é capaz de ganhar, e a senhora tem gente colocada em lugares chave capazes de o promover bem. Por mim, porém, tê-lo ia candidatado a um Guiness para a maior concentração de asneira por centímetro quadrado, um recorde a ombrear com a pantagruélica feijoada da Ponte Vasco da Gama e a incontornável chouriçada de Vagos: nalguma coisa havemos de ser bons.

Silas Granjo

Consulte o blog http://silasgranjo.no.sapo.pt/Troviscal.no.blog

7 de setembro de 2005

AZURVEIRA - MURO DA PREPOTÊNCIA

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AZURVEIRA – MURO DA PREPOTÊNCIA
A Azurveira (ou Azurbeira, para a sinalética oficial) teve honras na local do JB pela beneficiação da rua Dr. Manuel dos Santos Pato até ao termo da localidade. Passeios aqui e ali, locais de estacionamento, risco branco ao meio, linhas laterais e zebras vieram proporcionar maior comodidade na circulação viária entre os cruzeiros da Barreira e do Areeiro. A obra teve invernos de reclamações. Mas está lá. Mais vale tarde do que para as calendas… Para Bustos, a demora, até parece normal. Os melhoramentos “llegan cuando llegan”.
A melhoria das condições foi possível com a oferta de fatias de terrenos no enfiamento da rua (e/ou estrada municipal nº??). Aconteceu que um dos proprietários, o Engº Santos Pato, ficou surpreendido com o derrube de parte do muro e “extorsão” de uma fatia do seu terreno, sem ninguém responsável lhe ter dito “água vai”.
O lesado dirigiu protesto a Oliveira do Bairro (Câmara Municipal), acompanhado de exigência de construção de um muro. Acílio Gala pediu as devidas desculpas pelo sucedido.
Junto ao pedido de desculpa, estava incluída a construção de muro remetida para o presidente da Junta de Freguesia de Bustos.
A “audiência” entre o lesado Eng. Neo Pato e o eng.-técnico Manuel Pereira aconteceu na quinta-feira. Foi acertada a data da construção. Já na segunda-feira lá estavam os blocos, máquina e areia, conforme foto.
Um sinal de “dinamismo” a merecer inauguração com placa a condizer: “MURO DA PREPOTÊNCIA” etc. e tal… o dito Muro não será o verdadeiro casaco do soberano(1)?

Para registo. O dito “Muro da Prepotência” que a Junta de Freguesia de Bustos está a levantar fica na zona do Jardim Infantil contígua à Capela de Nossa Senhora dos Emigrantes da Azurveira. As parcelas de terreno onde estão implantadas estes dois equipamentos já tinhm sido oferecidas pelo Eng. Santos Pato (Neo Pato).

À margem. Senhor presidente da Junta da Freguesia de Bustos, as placas da célebre homenagem pública a Jacinto dos Louros e ao Dr. Manuel dos Santos Pato irão brevemente (re)voltar á luz do dia? Ou continuarão a ficar escondidas na cave do edifício da Casa da Freguesia ( Junta de Freguesia)?

(1) – Adaptado de Aquilino Ribeiro, Quando os Lobos Uivam.
...
Sérgio Micaelo Ferreira
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Rectificação:
O Eng. Santos Pato vendeu a parcela de terreno onde está o jardim infantil.
As minhas desculpas aos intervenientes na construção do espaço dedicado às crianças. As desculpas são extensivas aos leitores.
(o seu a seu dono)
Sérgio Micaelo Ferreira

5 de setembro de 2005

JOGADAS!



Tendo em conta a polémica em torno da inexistência de verbas para a construção do parque desportivo da União Desportiva, não deixa de ser irónico que o futebol de Oliveira do Bairro seja financiado pela Câmara Municipal e por uma empresa de Bustos…
A notícia do JB pode ser lida aqui.

4 de setembro de 2005

Postal da Costa Nova: A NOITE DE DINO FONTES

Tenho com a Costa Nova uma relação tão velha quanto eu próprio. É uma parte dos meus afectos, a paisagem de um mês na vida de cada ano. E que mês! Agosto valia por um ano inteiro, marcando um antes e um depois, como se a presença do mar fizesse toda a diferença.
Quando era miúdo e media todas as distâncias tendo por referência o percurso entre a minha casa e a Escola Primária, ir para a Costa Nova era o melhor que podia existir cá neste mundo. A festança começava com uma viagem na velha Hanomag de caixa aberta, a fumarenta camioneta do meu pai. E se lhe chamo velha é com ternura, ela envelheceu diante dos meus olhos, foi perdendo o brilho e a força.
Tinha uma capota azul-turquesa empoleirada sobre umas rodas gigantescas, um banco corrido castanho e um volante maior do que um aro de bicicleta. Quando rumávamos à praia a carroça mecânica (meu pai sempre aproveitava a viagem para lembrar os tempos em que partia num carro puxado por uma junta de bois) ia bem carregada de necessidades, o que em geral significava: garrafas, mantas, batatas, roupas, vinho, loiças, panelas e, se necessário fosse, algum colchão. Tudo dependia do que existia no palheiro (as casas de madeira da Costa Nova) alugado em cada ano.
Com os palheiros listados da Costa Nova, casas vestidas com pijamas às riscas, sempre tive uma relação de doce encantamento. Que mais podia desejar? Tinha um lar de riscas azuis e brancas virado ao nascer do sol. Na frente um manto de águas prateadas com barcos à vela, nas traseiras o grande oceano e o ocaso solar.

De todas as casas por onde fui passando recordo especialmente aquele primeiro andar sem riscas, quase em frente ao busto de Arrais Ançã. Ali, bem no centro de toda a animação, entre a agitação dos cafés, por cima do estendal de uma loja com tolhas e postais ilustrados, paredes-meias com a ria. Ao anoitecer a avenida iluminava-se, transformando-se numa verdadeira passerelle, no local de encontro e desfile dos veraneantes.
Para mim, miúdo e sem autorização para sair à noite, era a sorte grande. Sentava-me na varanda a assistir ao vai e vem do povo, avenida abaixo, avenida acima, ao som de musica variada difundida por auto-falantes presos nos candeeiros. Música que enchia a avenida até às onze horas, hora do encerramento do sonoro, sempre com um solo de trompete, o toque do silêncio.
Para cá, para lá, para cá, para lá, ia marchando a gente, e as mães vigiando o namoro das filhas, e as esplanadas dos cafés repletas, e o cheiro doce da bolacha americana misturado com o odor da maresia.

Estávamos em meados dos anos sessenta. Então o ancoradouro dos barcos (hoje transformado em posto de turismo, bem dentro de terra) cumpria por inteiro a função aquática tendo a seus pés o leito da ria onde ainda labutavam alguns moliceiros, ainda havia gente encinhando as águas. Portugal vivia deprimido entre o temor da guerra colonial, e a repressão de um regime totalitário, beato e machista que promovia a separação dos sexos.
Também por cá uma nova música veio agitar um pouco a moral e os bons costumes oficiais mas, pelo menos na Costa Nova, mais importante do que os Beatles ou qualquer “Love Me Do” foi a revolução do gira-discos portátil, o que veio permitir a realização dos primeiros “ bailes particulares”. Bailaricos nas tardes de domingo, supervisionados pelos olhares atentos de algumas mães, realizados no pátio de uma das várias casas alugadas por amigos e conhecidos (ao tempo a comunidade bustuense que passava as férias na Costa Nova era muito significativa). Verdadeiras ousadias numa época marcada por uma severa e restritiva moral oficial que proibia tanto os beijos em público como a Coca-Cola ou os ajuntamentos com mais de cinco pessoas.

É neste ambiente tacanho e totalitário, cheio de polícias e bufos, todos eles atentos guardiães da moral e dos bons costumes, que o inesperado aparecimento do bustuense Dino Fontes no desfile nocturno da Costa Nova provocou tal escandaleira que a sua memória ainda perdura. Pelo menos para mim que, de olhos esbugalhados, tudo observei daquela varanda, numa casa sem riscas.
Estou a vê-lo; impecavelmente vestido e melhor penteado, com um sorriso ligeiro, indecifrável. Chegou e, sem parar no café ou em qualquer outro lugar, entrou na “procissão” ladeado por duas espampanantes raparigas. As duas loiras (ou seriam morenas?), as duas indubitavelmente bem torneadas, com gestos destemidos e vestes citadinas. Um espanto!
Dino era uma referência, um conquistador com formação e estilo, um malandreco sorridente e misterioso, capaz de fazer vacilar os corações mais empedernidos. Tinha (tem) uns olhos raros e era filho de um verdadeiro mestre na arte do namoro, de um estudioso do feminino, o que mais ajudava a ampliar a enorme fama. Aquela noite, na Costa Nova, ao aparecer com as duas desinibidas raparigas provocou um bruá que deve ter chegado à Barra porque, pouco tempo depois de o trio ter iniciado o passeio, já havia gente descendo à avenida apenas com o propósito de presenciar o evento. Uns apreciando as frescas meninas, outros invejando a sorte do macho e alguns, os castos de sempre, rangendo os dentes, receando pelo fim dos bons costumes e da moral vigente.


Mostrando indiferença no caminhar, mas sabendo-se debaixo de todos os olhares, em especial das escandalizadas mães sentadas ao longo das soleiras, Dino Fontes recriava-se ao longo do percurso, ensaiando alguns números para os espectadores mais atentos.
Caminhava de mãos nos bolsos, lentamente, as raparigas bem perto, ombro a ombro, articulando em simultâneo as belas gambias. Dino nem sempre apreciava a sintonia e quando se fartava do ritmo, ou queria testar a concentração feminina, acelerava o passo provocando o destrambelhar do grupo e a divertida corridinha das surpreendidas ninfas logo tentando acertar o passo.
A certa altura aquilo transformou-se num jogo de inesperadas acelerações e algumas injustificadas inversões de marcha. Era vê-lo a virar costas e elas a continuarem em frente, desprevenidas, até lhe darem pela falta e rodopiarem para nova corridinha até se colocarem de novo ombro a ombro. Por vezes parava para as receber com um ligeiro erguer de braços, logo voltando a enfiar as mãos nos bolsos, retomando a postura altiva e principesca.
Há muitas formas de um jovem mostrar a sua irreverência e o Dino enfrentava com grande compostura e sarcasmo o moralismo de então. Não o fazia por acaso, cumpria um desafio, talvez uma aposta. E sobretudo exercitava um estilo que fez escola; ironizava, como cumpre a qualquer provocador, pacífico, minoritário e divertido.

Belino Costa

PS: A tradição do passeio nocturno mantém-se e foi significativamente reforçada este ano com a inauguração de uma nova e cuidada calçada portuguesa decorada com motivos marítimos e a introdução de mobiliário urbano a condizer, incluindo uma moderna iluminação nocturna, tubos de luz branca.
A calçada Arrais Ançã, segundo a placa oficial, veio dar um novo brilho ao tradicional passeio nocturno, hoje bem mais informal, desorganizado e descontraído do que nas aperaltadas noites dos anos sessenta.

3 de setembro de 2005

ARRANJE-SE O CENTRO! (Arsénio Mota)

(clicar sobre a imagem)

Bustos tornou-se conhecido ao longo dos tempos pelas curvas da sua via principal e, sobretudo, pelo S que lhe congestiona o centro. As melhorias correctoras recentes foram algumas mas foram escassas. Impõe-se ali uma intervenção urbanística de fundo agora que a aquisição e demolição pela autarquia da casa que foi de Manuel Simões Lusio relança o assunto!
No fim de contas, é toda a zona da igreja, ruas Jacinto dos Louros e 18 de Fevereiro, até ao largo do palacete (Rua do Cabeço) que entra em cena. Dentro dela ficam o cinema, os cafés Piripiri e Quim, o terreno da família Aires (onde funcionou o café Recreio) e, um pouco adiante, os que pertenceram aos irmãos Micaelo e à mãe da Lila e do Neo.
A importância urbanística e a relevância social desta intervenção – que por ora meramente se adivinha ou apenas se almeja – são tão avultadas que aconselham a máxima ponderação e uma adequada inteligência. Convém que técnicos competentes elaborem o estudo prévio e que em seguida este seja posto à apreciação e discussão públicas, designando com toda a clareza o construído que existe e será eliminado e os respectivos custos financeiros.
Ninguém poderá contemporizar com uma intervenção de vistas curtas, feita de «remendos» pontuais apressados, isto é, sem uma visão clara de futuro com base em projecto global discutido e aprovado. A confusão de ideias sobre o que irá implantar-se no espaço da antiga casa de Manuel Simões Lusio (ver os «Comentários» no local próprio) exprime bem o que deve ser evitado pelos responsáveis da autarquia.
Depois de ficar elaborado, discutido e aprovado o plano de arranjo urbanístico para o centro nevrálgico de Bustos, poderá avançar-se passo a passo, conforme as possibilidades, na sua concretização no próprio terreno. Importa é que esse plano seja traçado com visão larga, recolhendo a maior soma possível de contributos válidos. Neste sentido, lembro a propósito as sugestões que o amigo e conterrâneo Alcides Freitas tem feito… e ele, com toda a sua experiência, sabe bem do que fala! E, sem dúvida, outras propostas se manifestarão.
Na verdade, vocês já sabem, o futuro começou ontem. Por isso, não continuemos hoje a bocejar, entretidos com intrigas da história da carochinha. É o que vos diz o abaixo assinado,

Arsénio Mota


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