- Boa tarde! Como vai a senhora? – perguntou, sorridente, a Fatinha, na nossa preparada cumplicidade.
Na sala, propositadamente semiobscura, um elegante candeeiro de pé alto esforçava-se por estender aos nossos olhos a sua luz difusa.
Para mim era fácil reconhecer-te, professora! Estavas ladeada de afectos e a lareira acesa iluminava o teu rosto, interrogativo.
- Conhece esta senhora? – perguntou a tua “menina”, mãe de dois netos que te completam a vida.
- Não, não conheço!
Não desarmei. Avancei na tua direcção e as luzes acenderam-se transbordando claridade.
- Olhe bem para mim e não diga que não me conhece! – insisti, confiante.
Logo ali te levantaste e abriste os braços:
- És a Irene!!! Tens a mesma voz, o mesmo rosto… até a mesma cor do cabelo e… és tão linda!
(Lembras-te, Milita? Foi em tua casa que me mostraste a fotografia. Quanto nos rimos ao recordar cada rosto que se ia tornando, a pouco e pouco, mais familiar. «Milita, tu és uma princesa! Ao pé de ti, sou o patinho feio e ainda por cima não se vê o laço… porque eu sei que tenho um laço branco na cabeça, Milita!». « És agora feia! Eu não acho nada! – tentava consolar-me a minha prima Anabell e, logo depois, a minha irmã»)
O que importa é que tu estás aqui, professora - tu que adoras viajar, fazer os outros felizes e nos chamas «filhas» - e eu vim ainda a tempo de te abraçar, de te olhar nos olhos e dizer “Obrigada!”, os nossos corações plenos de ausência…
Obrigada também a toda a tua família, à tua (e minha) Fatinha: “nunca me cansarei de fazer tudo o que estiver ao meu alcance para dar alegria às pessoas, e uma alegria para a minha madrinha é, para mim, uma alegria a triplicar!” – segredava-me ela, feliz!
Será que há mais para dizer?...
«… como está o Carlitos?... o Carlitos que me vinha sempre visitar quando estava de férias?» Via, agora, na Internet ("Recordação da Escola" da Quinta Nova - uma relíquia), ocupando todo o ecran, a fotografia de grupo «.. e a Milita Aires?... e a Gisela?...e a Vitália? …no Brasil?! E eu que fui tantas vezes ao Brasil! …a Julita vejo eu …uma querida… Amanhã vou telefonar-lhe… A Dorinda encontrei-a um dia em Aveiro…»
E foram tantos, tantos os nomes, eu acho que foram todos, ela sabia tudo, a todas conhecia, … fazia-me perguntas e eu… quase nada sabia… perdi no tempo as minhas colegas, as minhas amigas, a minha querida Candita, com quem tantas vezes brinquei e lanchei na casa dos seus pais…, a Vitalina, tão alta e tão alegre que ainda ouço as suas gargalhadas entoando pelo recreio e pela estrada, a caminho de casa… « …se pagavam quando preparávamos as alunas para o exame de admissão?…não, filha, que ideia!... recebi algumas lembranças que ainda hoje conservo… olha, davam-me um galo, na Festa do Galo! (E ria, ria…na memória das saborosas aves de capoeira, de crista vermelha e penas brilhantes reforçadas por serpentinas coloridas que, de repente, lhe povoavam a sala pelo Carnaval ) E …que é feito do senhor Augusto Serafim? Ainda tenho na minha cama um cobertor que ele me deu… e já foi da Fatinha!... lembras-te do senhor Hilário Costa?... comprava os tremoços, os amendoins, os rebuçados…e nós fazíamos uma grande festa! Um dia até tive de fazer um discurso…
… quis vir despedir-se à porta de casa.
… porque nós estamos todas (mesmo as que partiram tão cedo!) à espera, na Escola dos seus vinte anos, a recuperar sonhos da infância e, sobretudo, a entrelaçar e a tecer novamente os elos que se foram partindo nesta caminhada de meio século…
Até breve, queridas colegas!
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