Em Agosto a Feira de Bustos abriga-se sob a protecção de uma frondosa alameda de plátanos. Espraia-se pela sombra, convidando às compras quando não ao passeio. Por lá andei no dia 22, com a atenção própria de quem visita e quer ver.
Pois, estranhamente, não vi caras conhecidas. Era como se por ali já andasse outra gente, ou que as caras de sempre se tivessem ausentado. Os primos, os tios, os antigos vizinhos, os colegas de escola, os amigos e demais conhecidos, todos pareciam ter partido para banhos, preferindo o sol da Costa Nova e da Vagueira às sombras do Sobreiro.
Desejei-lhes bom proveito enquanto ia saboreando a sombra, espreitando as bancas, suas mercadorias, vendedores e demais clientes. Aquele homem de manga curta e calções até aos joelhos, calçando umas havaianas, só por distração poderia ser tomando pelo típico habitante local. Bastava ouvi-lo falar com a companheira para perceber que quem fala francês assim, tão alto e com tal sotaque, só pode ser um emigrante em tempo de férias.
Mas ao contrário do que acontecia quando muitos tiveram de ir a salto para França, agora as roupas são breves, leves e coloridas. Vestidos cor-de-rosa, verdes, azuis, violetas… Uma festa de cor abraçando as árvores, pendendo como frutos.
Havia alguma clientela de volta dos sapatos, mas pouco interesse despertava a olaria tradicional em barro. Outra agitação despertava a banca das camisolas e bonés das equipas de futebol, com especial destaque para o equipamento da selecção nacional. Os êxitos futebolísticos continuam a empolgar a juventude, pelo que não faltavam bandeiras e camisolas verde-rubras promovendo o culto do nome de Portugal. Nem faltava também um representante do país irmão (mudam-se os séculos e muda a emigração) levantando num alto mastro a bandeira do Brasil e noutro, a igual altura, a de Portugal.
A grande surpresa aconteceu mais adiante. Foi quando descobri um vendedor de esteiras. Esteiras em Agosto de 2006! Parei diante de tal anacronismo. Conheci então o inesperado artífice, um rapaz de Perrães que usa os tempos livres para fazer e comercializar esteiras e cestos. Logo me lembrei de notícias antigas dando conta que gentes da faixa ribeirinha do Cértima (Silveiro, Gesta, Perrães e Rego) vinham até Bustos nas vésperas da festa do S. Lourenço para fazerem a Feira das Esteiras.
Teria recuado no tempo ou estaria a ser vítima de uma qualquer ilusão? O rapaz de Perrães logo abriu uma esteira para me deixar perante a inegável realidade. E qual arauto da tradição declarou:
- São12 Euros. É bom e barato!
Concordei. Era um baixo preço, recompensando mal o esforço, a técnica e a dedicação do artesão. Enalteci o trabalho, sublinhei o seu simbolismo, o gesto de resistência cultural, mas não fiz a compra. Com a cumplicidade do vendedor fiz outro negócio, troquei a esteira por um retrato.
Ganhei o dia.
Belino Costa
Mesmo que as tecnologias se desenvolvam e cada vez mais as pessoas escrevam como bem entendem, ou com a ajuda de corretores automáticos dos computadores, todos sabemos a importância e o sabor de um bom texto. Gostei especialmente deste, que me fez nascer a nostalgia de passear na feira. Andei, também eu, aqui sentado, pela feira ao sabor da experiência do autor.
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