7 de janeiro de 2006

CONFISSÕES DUM COMBATENTE

ou
O Homem do Ano, pelas piores razões


Meu Querido Amigo Dr. Acílio Gala:
Enquanto o conheci a presidir à Câmara e lá se foram 13 anos das minhas obrigações cívicas concelhias, o Sr. foi sempre o último a rir. Trabalhador incansável, organizado, competente e astuto – muito astuto mesmo – o Sr. levou sempre, mas sempre, a água ao seu moinho.

Enquanto Presidente nunca lhe vi aprovada qualquer proposta dos outros; refiro-me às que eram apresentadas e votadas na Assembleia Municipal e cujo conteúdo procurava consagrar os anseios dos seus munícipes.
Apesar disso, foram sempre as suas propostas e iniciativas que vingaram, fruto exclusivo das suas brilhantes ideias, que até o foram muitas vezes.

O Sr. ouviu muitas opiniões dos deputados da Assembleia mas raramente as escutava, para não ter de lhe dizer que as mais das vezes fazia orelhas moucas; ou então, fazia gala da sua astúcia de velha raposa do deserto (de Moçâmedes?), reciclando-as ao seu estilo e ideologia.

Claro que já deve ter percebido do que lhe estou a falar.
À cautela, recordo-lhe a dolorosa peripécia que ainda hoje ensombra o Monumento aos mortos do seu ultramar, ou lá como é que lhe chamou, que “Monumento aos ex-Combatentes da Guerra Colonial” é que ele não é.
Sim, ensombra-o e ensombra-me.
Sabe, eu tenho de viver o drama diário de passar ao lado daquele espaço e não são poucas as vezes que lá me detenho por momentos; como lhe prometi na altura, saiba também que o faço sempre defronte à face poente do ferrugento ferro, a lembrar muito apropriadamente a ferrugem das armas e dos metais dos esquecidos tempos da guerra colonial.
Olhe: é na face poente (tinha que ser a que está virada para Bustos) que estão gravados os nomes dos meus ex-camaradas caídos em combate.
Fazendo vista grossa à salgalhada que é o contexto espacio-temporal do monumento, encontro apenas (na face poente, que a do nascente é da sua lavra) um conhecido verso de Camões a encimar a lista dos onze nossos camaradas concelhios mortos nas principais 3 ex-colónias africanas:
E aqueles que por obras valerosas
Se vão da lei da morte libertando

Esta face é a nossa e mais não lhe digo porque, que eu saiba, fomos aqueles onze e mais uns quantos a vestir o camuflado que a gente esfarrapava ingloriamente nas duras matas e bolanhas e depois tapava com os largos adesivos do enfermeiro do grupo de combate, quantas vezes para estancar o sangue ingloriamente derramado.

Pois fique sabendo, meu Amigo, que é essa visão que me levou a abandonar o revisionismo reformista, filho dilecto do economicismo socrático dos dias correntes.
Deixei-me de comodismos e de desejos de agradar e (porque não?) regressei aos meus anos 60/70, os do querido M. Bakunine.
A esse mesmo! Ao anarquista do séc. IX que escrevia:
“A SALVAÇÃO PÚBLICA NÃO DEPENDE JÁ DO ESTADO MAS DA REVOLUÇÃO”.
*
oscardebustos, o que nos “bate-estradas” enviados do mato à Família e Amigos se assinava:
Oscar Aires dos Santos
Alferes Miliciano
SPM 6276

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