- Zé Valério!
O nome veio rasante e atingiu-nos em cheio. Nesses idos de setenta, ao Sábado de manhã, em pleno mês de Março, meia Luanda passava pelo Maria da Fonte. Suculentas, as bancas da fruta rescendiam a papaia, manga, mamão, abacaxi, e refrescavam-se os olhos nas verduras das hortas de Luanda.
- Eh, Zé Valério!
O nome veio rasante e atingiu-nos em cheio. Nesses idos de setenta, ao Sábado de manhã, em pleno mês de Março, meia Luanda passava pelo Maria da Fonte. Suculentas, as bancas da fruta rescendiam a papaia, manga, mamão, abacaxi, e refrescavam-se os olhos nas verduras das hortas de Luanda.
- Eh, Zé Valério!
Fomos rompendo caminho até à voz que chamava. No cimo da banca, a Dona Isilda, era quitandeira branca, corpo e alma grande, génio assomadiço. Era a Bairrada amigada com o calor de Luanda. Era a mulher do Seabra, funcionário do Governador. Morava numa casa gandaresa, na sombra do Palácio, com uma mangueira no pátio e uma mesa longa, onde comia quem por bem chegasse.
- Conheci-te logo. És o Sérgio, o irmão da Alice, não és? Tal qual o retrato de teu pai. Dito e escrito. Grande homem, o Zé Valério!
Ali aprendi de ouvido que o Zé Valério era Bustos.
Depois, vi que era Aveiro, Águeda, Palhaça, Mamarrosa, era Seia, Costa Nova, era onde houvesse vida em festa. Era assobio de melro, artista em molde de pé, feirante de sol a sol, alma a abarrotar de música, com letra de fino traço, verão a pedir Vagueira, petisco de peixe fresco, palavra pronta na hora. Tertuliano de gema, tinha cardápio de amigos. Fossem janotas, pedintes, doutorados, artistas da sua lavra, todos lhe entravam em casa. Primeiro na oficina, depois na sapataria. Remoque era para a mulher. Retrucava, retrucava, mas quem mandava era ela.
A ti Adália só ria, de tanto bem que lhe queria. Ela esmerava, esmerava, cozinhava que nem chefe, num forno de ferro a lenha. À ceia havia escoado, a fumegar em travessas. Ao jantar era sopa à lavrador, rica de carnes e mimos, dos que criava na horta. Ao Domingo rescendia o frango assado no forno. Nos dias de festa rija, a chanfana era de reis. Dizia ele a mangar que ela tinha estagiado no Grande Hotel da Cúria. Cuidava a casa e o aido, tinha perus e coelhos, patos, frangos e galinhas, tratava horta e pomar, criou os filhos e netas. Que eu me lembre, não recebia ordenado. Ela não tinha patrão e não tinha profissão! Grande mulher, a ti Adália!
Gente Grande!
armigã
Quem se lembra do frita-iscas do Zé Valério?
ResponderEliminarTive o prazer e a honra de conhecer o José (Zé) Valério, que foi uma daquelas pessoas inesquecíveis de Bustos. Era uma daquelas pessoas que marcou uma geração de Bustoenses que agora se tenta esquecer. Era amigo do meu pai desde novo e conviviam frequentemente em Bustos com outros amigos.
ResponderEliminarO Zé Valério ficou conhecido por muitas frases bem interessantes e há uma história de Zé Valério que conto frequentemente a muitas pessoas de fora. Os iconoclastas de Bustos dizem que esta história é apócrifa, mas eu acredito nela, assim como muitos outros.
Um dia num jantar em Bustos com alguns amigos entre os quais Drs. e Engs.
Um Dr. disse ao Zé Valério qualquer coisa como. "Óh Zé és um sapateiro entre doutores. Deves~te sentir muito honrado!".
O Zé Valério diz "Sim sou sapateiro e nunca me trataram por Dr., mas aos Srs. Drs. já chamaram sapateiros".
Tenho um amigo nos Estados Unidos que, depois de alguma demora em lhe escrever, põe no cabeçalho do correio electrónico "Ze Valerio". Chega para eu perceber que ele pergunta se estou vivo ou morto. É que esse americano sabe que antigamente dizia-se que os mortos iam "morar para o Zé Valério" o que queria dizer que tinham sido sepultados no Cemitério de Bustos que fica em frente à casa de Zé Valério.
O Zé Valério era um homem com muita dignidade e daqueles que todos nós apreciavàmos. Tenho saudades dele.
Milton Costa