«'Conclusões' da Carta ao Juiz Corregedor». Autos de Segurança, processo nº 16.068/62, do 1º Juízo Criminal de Lisboa, fls. 182 e 183
1.°) - Nasci filho legítimo de uma família da média burguesia e fui educado, com meus irmãos na honra, na generosidade, no respeito pelos direitos e dignidade do próximo e na ajuda e socorro dos mais humildes.
2.°) - Meus Pais eram católicos e liberais – no perfeito sentido da palavra - e assim nos educaram.
3.°) - Meus Pais eram democráticos e nunca compraram para um filho um objecto que o não comprassem, também para os outros.
4.°) - Fui educado no respeito da verdade e da minha própria pessoa e dignidade.
5.°) - Procurei sempre ser justo e generoso.
6.°) - Casei-me por amor na igreja de Sangalhos e assim nas tradições de meus Pais e de minha Mulher, eduquei os meus três filhos também.
7.°) - Meus filhos têm cursos superiores, assim como minha Mulher.
8.°) - Dei a meus filhos o meu exemplo cívico e educação religiosa e não me poupei a sacrifícios, apesar das minhas dificuldades pois eles cursaram colégios qualificados e até minha Filha foi aluna do colégio de freiras da Av. Manuel da Maia.
9.°) - Tenho três netos, orientados como eu e os meus filhos o foram exactamente, para que possam ser livres e conscientes.
10.°) - Obtive pelo meu trabalho alguns bens que juntei aos que herdei de meus Pais e de meus Sogros, para suprir a eventual miséria da falta de saúde. Porém
11.°) - Porque fui candidato à Presidência da República, sou vítima de um insidioso, falso e malévolo processo, onde somente ressalta o desejo da minha aniquilação.
12.°) - Tal processo não é o meu retrato, mas o retrato da Pide.
13.°) - Esta pretende aniquilar-me, só porque participei numas eleições e assim quer aniquilar qualquer oposição.
14.°) - Com o seu processo contra o signatário mostram o seu inteiro desrespeito pela Lei e pela Justiça.
15.°) - Tais factos e a circunstância de termos chegado no nosso País ao extremo limite de ver destruídos todos os direitos cívicos fundamentais e até na profissão do signatário serem, como a Polícia pretende, coarctados os direitos de livre exercício, impuseram a actuação do homem e do advogado nessas eleições.
16.°) - As alegações que pretendem a minha prisão mostram claramente o arbítrio de que são passivos todos aqueles que não aceitam o partido único, como solução nacional imposta.
Por tudo, eu,
17.°) - Como um desses homens, mas criado e educado na fé da Lei e da Justiça, da pureza e da independência delas, até ao fim dos séculos,
Espero a minha liberdade
Cadeia de Caxias, Reduto Morte, um de Fevereiro de 1962 (dois).
O presidiário as. Arlindo Augusto Pires Vicente.
...
[in Guia da Exposição - na Casa Municipal - organizada pela Comissão Promotora do Centenário do nascimento de Arlindo Vicente]
Sem comentários:
Enviar um comentário