8 de setembro de 2010

.BUSTOS EXALTA REPUBLICANOS - SILAS GRANJO TROUXE TROVISCAL DA BANDA (1922 - 1939)

Antes de examinar o dia de hoje,
cumpre que se saiba como foi o de ontem…
(J. P. Oliveira Martins,
Os 50 anos da Monarquia Constitucional)


2010. Ano de grandes aniversários que sobrelevam a recente história cívica de Bustos:
. o 90º aniversário da criação da Freguesia (18 de Fevereiro’1920);
. o 90º aniversário da eleição da 1ª Junta de Freguesia (9 de Maio’1920)
. o 85º aniversário da criação da Paróquia de São Lourenço de Bustos (7 de Março’1925).




Da complementaridade dos grandes aniversários emerge o dever de Bustos prestar homenagem aos cidadãos que participaram na marcha lenta da conquista de autonomias administrativa e religiosa. E, parece ser consensual que este estádio de emancipação foi alcançado graças ao empenho indómito dos Republicanos.
A “colagem” do 85º aniversário da criação da Paróquia de São Lourenço de Bustos aos 90 anos da criação da Freguesia em dia de exaltação dos Republicanos é apenas para tornar mais claro que o movimento de ascensão paroquial foi liderado por um destacado defensor da jovem República. Ouçamos Hilário Costa (HC):
“Para a separação da freguesia de Bustos de Mamarrosa, muito contribuiu o sr. Jacinto Simões dos Louros, na parte civil e o sr. dr. Manuel dos Santos Pato, na parte religiosa.” (1)
E HC, entre 1972 e 1973, vai mais longe. Toma a iniciativa de prestigiar Bustos fazendo uma consulta pública a propor a inscrição destes dois ínclitos cidadãos na toponímia local, em ruas de assinalável destaque. Em resultado do empenho de HC, no Dia de Bustos’1973 é promovida uma “Justa Homenagem” aos destacados republicanos Jacinto Simões dos Louros e Dr. Manuel dos Santos Pato (2).

O 24 de Julho’2010, dia do Fórum de Bustos, em pleno ano do Centenário da Implantação da República, depôs o tributo devido à exaltação dos Republicanos, onde quer que tenha sido a sua intervenção cívica, ajudaram a erguer bem alto a bandeira verde-vermelha iluminada pelos holofotes da Liberdade, Igualdade e Fraternidade profusamente semeadas na Revolução Francesa. Não será demais anotar que alguns destes compagnons de route participaram de moto voluntário na primeira Grande Mundial para que a recém-nascida República Portuguesa fosse aceite membro de pleno direito no concerto das nações livres.

A estirpe dos Republicanos dos primeiros passos da República está desenhada por A. H. de Oliveira Marques. Ouçamos: “… Ser Republicano era professar uma moral própria e austera, actuante em cada momento da vida. Ser Republicano era ser activamente, revolucionariamente, um cidadão à romana, participando todos os dias nos negócios da colectividade. Ser Republicano exigia pois, uma aprendizagem, adquiria-se desde os bancos da escola.” (3)

O Republicano participava “todos os dias nos negócios da colectividade”… significa que Jacinto Simões dos Louros e Dr. Manuel dos Santos Pato contaram com a participação dos correligionários nas conquistas das mais sublimes aspirações cívicas de Bustos.

Socorremo-nos do testemunho de Vitorino Reis Pedreiras sobre a criação da Paróquia de São Lourenço de Bustos: “Coube-me a mim fazer a petição e outros foram angariando as assinaturas. Quero dizer que foram também os ateus a trabalhar e dirigir os primeiros trabalhos.” Mas só com intervenção directa do Dr. Manuel dos Santos Pato (“da Barreira”, sendo natural da Mamarrosa) Bustos alcançou a sua Paróquia(4).

Imagine-se a euforia que atravessou Bustos ao ter sido criada a sua Paróquia (5), apesar de na vizinha freguesia do Troviscal viver-se um ambiente de recíproca interdição: à excomunhão da Banda de Música o Povo Liberal interdita o Pároco de exercer o seu munus espiritual.

Assim, ao decreto de 18 de Novembro de 1922 conhecido em 15 de Dezembro, em que a Diocese de Coimbra lançava «o interdito à música do Troviscal” (6), o Povo Liberal do Troviscal em comício amplamente participado “resolve: 1º Lançar o interdito sobre todos os padres, que dentro d[o]s limites desta freguesia não poderão praticar qualquer cerimónia religiosa …” (7).


Os dois interditos que se abateram sobre a Banda do Troviscal fizeram emergir uma onda anticlerical em defesa da música e da lei da separação do Estado e das Igrejas que ultrapassou as fronteiras da região.

Silas Granjo reúne um acervo de documentos que ajudarão a compreender as feridas abertas pela laicidade que já andava a desnhar-se nos finais da monarquia e que a revolução de 5 de Outubro impôs.




A dureza do das posições antagónicas assumidas pelos liberais em defesa do livre exercício da Banda de Música contra o interdito decretado pela Diocese de Coimbra, leia-se arciprestado de Oliveira do Bairro, foi consequência do combate entre os republicanos adeptos e militantes da corrente anticlerical afonsista e a aliança monárquico-igreja conservadora que nunca aceitou a queda da Casa de Bragança. Não se pode descurar que o Troviscal Liberal era um importante feudo dos partidários de Afonso Costa. Veja-se o caso do maior número de telegramas de condolências pela morte deste caudilho enviados de uma localidade, saíram do Troviscal.


Duas curiosidades entre outras, a falta de «ouro» no pré-pagamento das exéquias abriu o caminho ao interdito da Banda. A oferta de uma «jóia» à esposa do Governador Civil de Coimbra foi o «pagamento» do Bispo de Coimbra pela prisão dos membros da Banda que os impediu de participar na parte profana das Festas da Rainha Santa.

A apresentação do livro “Troviscal Republicano: Banda Excomungada, Clero Interdito (1922 – 1939” no Fórum dedicado «Aos Republicanos» foi “uma forma de assinalar o centenário da República. De uma assentada evocamos um episódio marcante da luta pela construção do estado laico e recebemos um magnífico representante da tradição musical e do republicanismo troviscalenses” (Belino Costa).

...

Felizmente que actualmente as coisas de J.César estão separadas.

sérgio micaelo ferreira

________________

(1) in Hilário Costa, Bustos – Memórias de um bustoense, (Origens de Bustos, pg. 6), edição do autor, 1984.

(2) Nota: nunca será demasiado revisitar este episódio no citado livro de Hilário Costa (pg.s 95 a 98).

(3) in A. H. de Oliveira Marques, ENSAIOS DE HISTÓRIA DA I REPÚBLICA PORTUGUESA, (REPUBLICANISMO E IDEALISMO, pg. 33), Livros Horizonte, 1988.

(4) in Vitorino Reis Pedreiras, A Criação da Freguesia de Bustos (2), janeiro 12, 2005, Bustos – do Passado e do Presente; http://bustos.blogs.sapo.pt/arquivo/2005_01.html. Editado por Belino Costa.

(5) A criação da Paróquia de São Lourenço de Bustos bem merece ser estudada, ainda que se tenham perdido os testemunhos dos protagonistas (n. e.)

(6) in Silas Granjo, Troviscal Republicano: Banda Excomungada, Clero Interdito (1922 – 1939), pg.20,Sítio do Livro, L.da, 1ª edição. Lisboa, 2010 http://www.sitiodolivro.pt/

(7) idem pg.28

Sem comentários:

Enviar um comentário