ALDEIA NATIVA
O homem ama na terra os seus hábitos, se ali reside ou residiu muito tempo; ama a sua casa e o seu agro, se os tem; e, ama sobretudo, a sua infância, que lhe comandará a vida inteira e se amalgama com o drama biológico do envelhecimento e da morte. Ama esse período da sua existência por saber que jamais voltará a vivê-lo; e essa certeza de irrecuperabilidade embeleza-lhe o cenário nativo e valoriza-lhe os anos infantis, mesmo se neles conheceu a miséria, os trabalhos prematuros, as opressões e as humilhações impostas pelos adultos.
O homem ama na terra os seus hábitos, se ali reside ou residiu muito tempo; ama a sua casa e o seu agro, se os tem; e, ama sobretudo, a sua infância, que lhe comandará a vida inteira e se amalgama com o drama biológico do envelhecimento e da morte. Ama esse período da sua existência por saber que jamais voltará a vivê-lo; e essa certeza de irrecuperabilidade embeleza-lhe o cenário nativo e valoriza-lhe os anos infantis, mesmo se neles conheceu a miséria, os trabalhos prematuros, as opressões e as humilhações impostas pelos adultos.
Não importa que a sua aldeia seja bela ou muito feia seja bela ou muito feia, maior do que uma vila ou minúscula como um vilar, mimosa como uma horta pegada a um jardim ou áspera como um cerro pedregoso e nu; que exponha crianças sujas, misturadas com porcos e cães na lama das congostas, durante o Inverno, ou flores sobre os muros populares, na luz de cada Primavera. Ele dar-lhe-á o seu carinho através de tudo. Inteiramente alheio ao sentido de nacionalidade e ao patriotismo, pode odiar os vizinhos ou invejar os mais abastados de bens e de espírito; mas o pueril amor pela sua aldeia será sempre sincero, desconvencional e único, porque ao amá-la é a si próprio que ele ama.
Ferreira de Castro (Os Fragmentos)
Salgueiros, (Ossela) 24.05.1898 *29.06.1974. Porto
Percursor do neo-realismo.
“A Selva” (1930) marca o zénite da sua obra.
“Defensor das liberdades e dos direitos humanos, adversário dos regimes fascistas, Ferreira de Castro não teve filiação partidária, nem adoptou uma definição ideológica. Situava-se, contudo, bastante próximo do anarquismo, opção preconizada, mais no plano intelectual do que político, por alguns dos seus mais íntimos amigos, como Jaime Brasil e Assis Esperança. A sua obra, dominada pelos temas sociais é um apelo à tolerância e à fraternidade e um protesto contra as injustiças, as prepotências e atrocidades”, in António Valdemar, Diário de Notícias, “O êxito e o esquecimento” 24.05.1998 .
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