18 de fevereiro de 2014

SOBRE A EXPOSIÇÃO “18 RETRATOS EM CHAPAS DE VIDRO”

A partir de hoje na sala de exposições da Junta de Freguesia




Olhando para os 18 retratos incluídos nesta exposição temos que destacar a sua unidade e o olhar do fotógrafo que parece ter obedecido a uma preocupação quase jornalística. O seu olhar incide sobre a sociedade que o cerca.

Há um primeiro conjunto de seis retratos que têm por cenário o palacete do Visconde de Bustos, apesar de António Sereno e a sua esposa, Adelaide Brandão, não surgirem em qualquer imagem. São os trabalhadores do palacete, a começar por Manuel Matos Ala (foto 1), o contabilista e braço direito do Visconde, que é o único que conseguimos identificar sem margem para dúvidas. Nos restantes é possível estabelecer a relação com o palacete mas ainda não foi possível identificar os rostos. O torreão visto do jardim, e a loja do Sr. Visconde completam este conjunto.  



O segundo conjunto reúne imagens de grupo, retratos do povo. São cinco imagens especialmente ricas e há naqueles rostos muitos traços e características que nos são comuns. As roupas, os instrumentos de trabalho, os rostos, as joias, os xailes, os tamancos e a falta deles são pormenores que nos interpelam. Na última imagem deste núcleo, um senhor (patrão ou taberneiro?), bem ataviado e melhor calçado, serve um picheira de vinho a grupo sentado à mesa num momento de convívio.


O terceiro conjunto de fotografias reúne quatro retratos do que poderemos designar por “individualidades da aristocracia local” a começar no senhor Prior e a acabar no caçador de camisa branca e laço cuidado. Pelo meio há a imagem de um homem de belo rosto (provavelmente de olhos claros) e bigode cuidado que exibe um livro que tem no título a palavra “Calvário”. Curiosamente em 1906 foi editado em Portugal “O Calvario”, (Lisboa, A Editora, 1906. Tradução de Ribeiro de Carvalho et Moraes Rosa), do francês Octave Mirbeau, que conta a história de Jean Mintié, um escritor que por causa duma paixão devastadora por uma mulher de pequena virtude vive um autêntico calvário. Será que o retratado, ao exibir tal adereço, quis dar nota sobre a sua vida amorosa?


No quarto e último conjunto vemos três imagens que têm por tema central a criança. Julgamos ser sempre a mesma criança. Primeiro entre familiares (?), depois a brincar com um andarilho (a envolvente sugere o jardim do palacete) e, por fim, ao colo de uma anciã, possivelmente avó. Um notável retrato, cheio de mística.


Cada uma destas 18 imagens nos interpela e nos desafia. Quem era esta gente? Ainda há alguém que se lembre destes rostos, destes antepassados? O que faziam? Quantos anos viveram?
São inúmeras as perguntas, são muitas as suposições e as incertezas mas talvez esta exposição nos ajude a responder a algumas delas.
 Certamente que ajudará saber como chegámos até aqui. 
 Foi entre os papéis e os livros da professora Zairinha (Zaida da Anunciação Simões da Silva( 30.11.1917 – 26.10.2012), de Bustos, que Manuel Romão encontrou duas pequenas caixas contendo um conjunto de chapas de vidro com impressões fotográficas (Nouvelles Plaques Chiado) que, de acordo com o estojo onde se encontravam, eram fabricadas na Alemanha para venda nos Grandes Armazéns do Chiado de Lisboa e Porto.

O Manuel Romão partilha comigo o gosto por velharias e o interesse pela História de Bustos, pelo que tem o cuidado de não deixar ir para o lixo livros, objetos e papéis de quem vai falecendo.
A verdade é que ao longo dos anos vamos guardando papeis, livros, cartas, fotografias e todo um conjunto de recordações. São pedaços da nossa vida que por não terem grande valor material muitas vezes são desprezados ou destruídos após a nossa morte. E por ser esta uma situação recorrente o Manuel Romão faz o que pode na missão de não deixar que tais documentos se percam. A ele se deve que os pedaços de memória que a Professora Zairinha foi guardando ao longo da vida não fossem dispersos ou ignorados.
Quando fui à Azurveira dar uma olhadela a tais documentos logo o meu interesse incidiu sobre as chapas de vidro. Aquele conjunto de fotografias poderia fazer parte da memória de Bustos, ser o testemunho de uma época da qual não temos grandes registos fotográficos.
Era preciso digitalizar tais imagens, apesar das chapas se encontrarem bastante degradadas. Coube essa tarefa a um outro amigo, o fotógrafo Xavier Martins, a quem agradeço o fantástico trabalho que realizou. Toda a intervenção de digitalização e recuperação das imagens obedeceu ao critério essencial de, em caso algum, alterar ou manipular as imagens, tendo sido feita apenas uma pequena limpeza sem eliminar por completo riscos, ou outros problemas. O resultado aí está. À vista de todos.

Belino Costa

18 RETRATOS
EM CHAPAS DE VIDRO

Coleção Zairinha/Manuel Romão

Fotografo: Desconhecido

Chapas de Vidro (Nouvelles Plaques Chiado) com o formato 12x9cm.

Época provável: Primeiras décadas do séc. XX

Localização: Bustos/Bairrada 

1 comentário:

  1. Anónimo14:33

    Penso que quem tem as fotografias já se terá apercebido, que na foto 4, a senhora que está a agarrar as mãos do menino é a mesma da foto 5, bem como a criança.
    Na foto 5 o menino aparece ao colo (primeiro da esquerda para a direita) e a senhora está atrás da que tem a criança ao colo.

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