20 de julho de 2006

GAFOL - HOUVE POR BEM


OS LISOS (GAFOL) – EM BUSCA DE TERRENO PARA A ESCOLA

Em 1978, a mobilização popular arregaçava as mangas, enquanto as moscas marcavam pontos no tecto, na resolução de algumas carências locais.
Multiplicavam-se associações, criavam-se comissões, reanimavam-se clubes e os partidos animavam a disputa política. Nos cafés, as cadeiras atropelavam-se à volta das mesas cheias de copos de cerveja ou chávenas. No Piri-Piri, o jogo de xadrez, introduzido pelo Dr. Assis Rei, dava lugar aos prolongados e vivos bate-papos.
O presente e o futuro imediato fazia parte da ementa do que faltava na terra. A rua Augusto Costa continuava intransitável, apesar do povo da Póvoa já ter comparticipado com algum dinheiro. O alcatroamento não se fazia … e a justa indignação montava arraias...
Junto ao Rossio da Quinta Nova, a Rua Senhor dos Aflitos mais parecia a superfície lunar com as suas crateras. O graffiti “Avenida 25 de Abril” ainda hoje bem visível na parede da casa do Prof. Nelson Figueiredo espelhava o descontentamento pela apatia do poder local pelo absentismo no arranjo do seu pavimento.

Manuel Simões da Cruz (cacique do CDS/BUSTOS) abria acesa polémica com o PSD - o partido de maior implantação local – ao contestar a construção do cemitério novo.

A Junta de Freguesia[1] de Bustos reunia[2] extraordinariamente para “resolver e apreciar o programa do dezoito de Fevereiro”
...
Entretanto no Piri-Piri, durante a bica, a esquerda de raiz republicana seleccionava a fotografia com o torreão para cartaz do "18 de Fevereiro", que atravessou fronteiras e ainda hoje se mantém um ícone do genuíno Dia de Bustos, apesar da persistente decadência que tem acompanhado as celebrações desta efeméride.

Era o tempo em que a Junta de Freguesia contactava indistintamente os agricultores[3] que tivessem «máquinas com atrelado» basculante «para que oferecessem de boa vontade os seus serviços» para se poupar verbas com os fretes de saibro (ou areão) destinado ao conserto, dos caminhos e do recinto da feira…
Ainda não se vislumbrava o crepúsculo matinal da era do alcatrão.

A solicitação dos CTT-TLP, a Junta de Freguesia propusera um terreno situado a poente da Escola Primária do Corgo que não viria a ser instalado um novo serviço daquele serviço.

Apesar da «guerrilha» intrapartidária (CDS/PSD), a vontade colectiva sobrepujava o desejo do interesseiro. Comissões ad hoc apoiadas por compartes apresentavam petições à Junta de Freguesia a requerer alargamento ou abertura de caminhos. A ajuda popular e/ou de empresas completavam o esforço camarário e os caminhos nasciam.

Por exemplo, Manuel Moreira Ferreira e Manuel de Oliveira Sol constituem uma comissão a fim de solicitar abertura do caminho do bairro da Fonte da Barreira até à rua do Cabeço próximo da casa do primeiro peticionário. E para reforçar a petição, fizeram-se acompanhar de “uma lista de todos os inquilinos dos terrenos aonde diziam estar de acordo com a abertura do caminho. Estes trabalhos foram feitos grátis, mas tudo isto se deve às firmas Sotelha e Barrol”, que ofereceram o serviço de máquinas[4].”

Bem no centro de Bustos, meia dúzia de jovens com sangue na guelra animava a tertúlia da Barbearia SCHIK[5], instalada na casa da Sr.ª Amândia (viúva de Herculano Silva).
O Carlos Alves, já mestre tarimbado em múltiplas funções directivas, massagista, marcador de campo da UDB, membro da Comissão Pais e Encarregados de Educação e secretário da Junta de Freguesia, sentindo a carência de instalações da escola, lança para o ar a ideia de angariar fundos para a compra de um terreno destinado à construção de uma “Escola Nova”.

Clermando Caldeira[6], Filinto Augusto de Jesus Lourenço, Ilídio Rosário (o Lord)[7], Luís Jorge Ferreira Rei (Hoss), Luís Jorge Grangeia, Manuel Ferreira dos Santos (Manuel Caldeira), Manuel Marco, (designados por ordem alfabética) juntam-se a Carlos Alves e criam o GAFOL[8]. A responsabilidade da Tesouraria recaiu sobre os mais novos, Luís Jorge Grangeia, Manuel Marco (e ?)que abriram conta no Banco FONSECAS & BURNAY, agência de Vagos.

A área de terreno a adquirir deveria estar localizada no centro geográfico da Freguesia e fora da zona mais cara. Para a angariação de fundos propunham-se a desenvolver actividades de convívio e diversão. Realizaram um (?) baile no salão do 1º andar no Café Primor, no Sobreiro. Foi um sucesso. Entretanto o GAFOL viu cancelada a licença de organização destes eventos, por interposição do Bustos Sonoro-Cine, entidade possuidora de alvará. [apenas era concedida um alvará por freguesia).
Entretanto, o fim do ano estava próximo. ‘OS LISOS’ atiram-se à organização da passagem de ano com baile servido no salão do Duarte Nuno no Sobreiro. O sucesso foi de tal ordem que o proprietário daquele amplo espaço, aproveitando o registo de alguns terrenos do Sobreiro na área da Palhaça, consegue obter facilmente o alvará para a exploração de bailes.

Para além destes eventos, o grupo também angariou alguns fundos através da exploração de uma tasquinha de comes-e-bebes instalada no largo da festa [do São João? ou do São Lourenço?] e de uma quermesse[9]. ‘Chegámos a ir a Alcobaça pedir peças de louça', … 'mais tarde, oferecemos à comissão da Associação de Beneficência e Cultura de Bustos’ (ABC) o material que sobrou …” recorda Carlos Alves. E que não era assim tão pouco.

Os lucros eram depositados na conta bancária e a comissão ainda hoje terá ficha bancária …
Entretanto assola uma onda de emigração que atinge alguns elementos, Carlos Alves e Filinto Lourenço, para a Venezuela; Manuel Marco para a Austrália e Luís Jorge Grangeia ingressa na Universidade, e vai para Coimbra. Esta sangria provoca o adormecimento do GAFOL.
Da sua efémera actividade d'OS LISOS, há também a realçar o apoio [em dinheiro] para a construção do pavilhão gimnodesportivo do Colégio Frei Gil.

O GAFOL é um símbolo de uma época em que estava arreigado o espírito associativo e a dedicação ao serviço comunitário não estava à espreita da colheita de mordomias ou de quaisquer benesses.

Dos vários contactos havidos com os intérpretes da comissão angariadora dos fundos, ressaltou o o entusiasmo quando recordavam peripécias ocorridas no GAFOL. Por exemplo, Manuel Marco recorda as reuniões em casa de um ou de outro a programar as actividades do grupo e que no fim terminava com um copito de vinho…
A Luís Hoss, ao Filinto, ao Manuel Caldeira, ao Luís Jorge (Dr.), a Carlos Alves e a Manuel Marco um bem-haja pelas informações pesquisadas na memória e que tornaram possível alinhavar estes apontamentos.

Apesar da curta duração, o GAFOL tem um encontro com a história de Bustos.

sérgio micaelo ferreira
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[1] 1ª Junta de Freguesia da 3ª República democraticamente eleita em 12.12.1976 por sufrágio universal e directo. Era inicialmente composta por Alberto de Oliveira Cruz (Presidente), Carlos Alberto Ferreira Alves e Alcino Caetano da Rosa

[2] Sessão de 13.02.1977.

[3] Entre várias ofertas constam (por ordem alfabética) Adélio Reis Pedreiras, Alberto Santos, Alcina Caetano da Rosa, António Mota, António Romão, Aristides da Rita, Asdrúbal Neto, Diamantino Caldeira, Fernando Figueira, Humberto Reis Pedreiras (O Chico), Ismael Nicho, José Manuel Domingues (Prof.), José Simões da Costa (Zé dos Moras), Manuel Oliveira, Manuel Pires, Necas Cipriano, Virgílio Luzio. A Sotelha e a Barrol também colaboraram com máquinas. (s.e.&o.)

[4] Acta da Junta de Freguesia, 04.12.1978

[5] A partir das lâminas SCHIK, Manuel Martins de Oliveira (carteiro) sugeriu a designação 'chic' a Carlos Alves.

[6],[7] Já falecido
[7] GAFOL – Grupo Angariador de Fundos ‘OS LISOS’.

[9] Informação confirmada por Carlos Alves, Luís Hoss e Manuel Marco.

1 comentário:

  1. Anónimo14:52

    Faltou dizer neste trabalho o que foi feito ou onde para o que resta de Os Lisos. Porque havia dinheiro recolhido ou não? Mas o principal é isto: então em 1977 havia em Bustos gente assim tão admirável, tão participativa? Aplausos!!! Isso hoje serve então para o quê? Para nos fazer sentir a decadência enorme que reina aqui? E não terá remédio?

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