Passam hoje 50 anos sobre a inauguração da igreja de Bustos. Assinalando a data publicamos algumas fotografias desse evento assim com partes de um texto escrito pelo Bispo que a inaugurou,
D. Manuel de Almeida Trindade, numa sentida homenagem ao padre que liderou o processo da sua construção.
PADRE ANTÓNIO HENRIQUES VIDAL
Conheci o Padre Vidal no
tempo em que ele frequentou o Seminário Menor da Figueira da Foz. Estava-se em Outubro de 1937. A Diocese
de Aveiro seria restaurada no ano
seguinte. À nova diocese ficaram a pertencer freguesias que, antes da
restauração, faziam parte das dioceses
do Porto, de Viseu e de Coimbra. D. João Evangelista de Lima Vidal, depois de ouvir os
responsáveis pela formação dos futuros seminaristas, resolveu pedir ao Patriarca de Lisboa, que era
então D. Manuel Gonçalves Cerejeira, que os alunos de Aveiro fossem admitidos no
Seminário dos Olivais (Lisboa). O pedido foi aceite. Foi a maneira de alunos, vindos de três dioceses diferentes, se pudessem
encontrar, conhecer-se e ter os mesmos
professores. Entre estes como não lembrar essa grande figura que foi Mons. Pereira dos Reis? Muitos dos alunos que passaram pelos Olivais foram
por ele "contagiados”,
de modo particular, pela sua cultura litúrgica, antecipando, sob muitos pontos, a reforma do Vaticano II. O
Padre Vidal ficou a dever a este Mestre a formação que deveria depois
demonstrar na sua vida de pastor de almas.(...)
O Padre Vidal era um apóstolo. Começou por visitar os doentes nas suas casas e por acompanhar a gente pobre da
freguesia. Por seu lado, ele dava
exemplo de pobreza, andava a pé ou de
bicicleta e, só mais tarde, comprou um modesto automóvel — um 2CV. Foi assim, pelo exemplo de uma
vida pobre, que o Padre Vidal foi conquistando aos poucos a gente de Bustos - e não só dc Bustos...
Com que emoção li um artigo da pena do arquitecto Rocha Carneiro
publicado no Jornal da Bairrada o seguinte titulo: "Igreja de
Bustos e a arte"! Diz assim: "De
todos os homens que
nestes últimos quarenta anos mais me fizeram pensar em Deus, o Padre Vidal é um deles." Quem dera que de todos os pastores de almas (mesmo
dos bispos) se pudesse dizer o mesmo…
Foi este homem pobre que se lançou
aventura de construir uma igreja nova. Teve a sorte de encontrar um engenheiro competente - Neo Pato - e um
arquitecto "aggiornato",
quer dizer conhecedor das orientações que o Concilio Vaticano II acabara de dar
na Constituição sobre a sagrada
Liturgia. Esse arquitecto foi Rocha Carneiro. Ambos se consideravam "agnósticos". Só Deus
sabe a que parâmetros se estendia o seu agnosticismo. A verdade é que, em contacto com o Padre Vidal, esse
agnosticismo se revelou apenas de
fachada: lá dentro estava a saudade
de Deus. "Para estar de bem com a minha consciência — escreveu o arquitecto Rocha Carneiro — o espaço que
tinha de projectar tinha de
ajudar o homem a encontrar Deus".
Encontrados os desenhadores do
projecto, era agora necessário obter meios económicos para o levar por diante. O Padre Vidal teve de andar de porta em
porta, a pedir esmola, a organizar
cortejos dentro da freguesia e até de atravessar o Atlântico e ir â Venezuela bater à porta dos emigrantes da Bairrada que para ali tinham
partido. Nada disto foi em vão. À medida que se abriam os alicerces, se iam
construindo as paredes. pondo as telhas... ia chegando o "cum quibus" para fazer face à construção. Tive a sorte de presidir à inauguração da nova
igreja. Foi para mim um deslumbramento: ora aqui está uma igreja — pensava eu —
que realiza, à letra, as normas que eu tive a felicidade de subscrever durante
as sessões do Concílio! (...)
Manuel de Almeida
Trindade
Bispo Emérito de Aveiro
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